Salvador, Bahia. Sexta-feira da
semana passada, dia 27 de maio, data mergulhada no feriadão de Corpus Christi. Nove
horas da manhã e a praia já bombando sob um calor de mais de 30 graus, o sol
intenso e sorridente pinicando minha pele, o guarda-sol fazendo uma sombra
providencial ao banquinho em que repouso o copo de caipirinha gelada.
Caipirinha gelada às nove da manhã? Sim, madama, sim. Na praia, pode. Em
Salvador, à beira-mar, sob um sol de 36 graus (fui conferir no termômetro da
barraquinha de venda de acarajé), pode. Não só pode, como deve. Ah, que delícia
esse calor, esse sol, essa luz, essa caipirinha, esse despertador que não para
de tocar... Droga! Acordei!
Caxias do Sul, Rio Grande do
Sul. Sexta-feira da semana passada, dia 27 de maio, data mergulhada no feriadão
de Corpus Christi. Nove horas da manhã e a neblina toma conta de toda a cidade,
sob um frio de oito graus, nenhum vestígio de sol, apenas uma sensação de gelo
picado pinicando minha pele, mesmo entrouxado em pijama, chinelo de lã, chambre
e ceroulas (eu não uso ceroulas, madama, mas a imagem surte lá seu efeito no
desenrolar da crônica, combinado?). Salvador ficou no sonho. A realidade é
outra. Bem outra. Os compromissos se acotovelam na agenda e a caipirinha vai
ter de ficar para o final de semana, quando e se alguém me convidar para uma
feijoada. Até lá, realidade nublada pela frente.
Nublada ou, melhor dizendo,
neblinada. Porque o que se vislumbra pela janela do escritório ao acordar é um
imenso, convicto e inexpugnável... nada! Um nada só possível de ser tecido a
partir do adensamento de uma neblina espessa, estacionária, profundamente alva
e determinada a se manter envolvendo a cidade toda por ainda muitas horas
depois de nascido o sol; um sol que ninguém vê e nem sente, mas que
acreditamos, porque somos um povo de fé, que ainda exista e esteja a brilhar em
algum lugar do planeta, além da neblina, sorrindo lá em Salvador, ao menos, que
seja. Tomo uma atitude! Pego o telefone e me ponho a procurar números a fim de
desmarcar os compromissos matinais que eu tinha de cumprir fora de casa. Afinal,
com essa neblina, não se enxerga nada, acabarei me perdendo e indo parar em
Farroupilha.
Mas, de repente, a esposa
aparece vinda do nada e abre a janela. Não há neblina alguma. O dia é nublado,
sim, porém, tratava-se do vidro que estava embaçado. Totalmente embaçado. Nem tanto
a Salvador, nem tanto à Serra. “Nem tudo que reluz é loiro”, como dizia minha
bisavó. As aparências enganam. Vamos ao trabalho. Suspiro profundo e aquela
vontade de caipirinha...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 30 de maio de 2016)
Nenhum comentário:
Postar um comentário