Cenário 1: À sombra de um vulcão,
no Período Cretáceo, exatos 65 milhões de anos atrás. Venha, madama, não tenha
medo, suba aí nesse coqueiro e observe. Eu sou Ugh, meu ancestral direto, um
típico homem das cavernas. O dia já amanheceu e eu, Ugh, vou saindo, tacape em
punho, da caverna que habito com Agh, a mulher das cavernas minha companheira,
com quem tenho os filhos Ughinho, Bambam e Pedrita, para alimentar. A
expectativa de todos é de que eu retorne logo trazendo um suculento dinossauro
para servir de refeição para toda a família. Ainda não criaram a tele-entrega e
nem a língua inglesa para substituí-la por delivery, impossíveis de imaginar
antes da invenção das motocicletas, dos telefones para fazer os pedidos e dos
motoboys. Só resta mesmo eu, Ugh, empunhar o tacape e ir à caça do primeiro
dinossauro que encontrar pela frente e transformá-lo em banquete. Lá vou eu.
Horas depois, já ao findar do
dia, retorno à caverna de mãos vazias e com uma catastrófica notícia para
informar à faminta família: não há mais dinossauro algum sobre a face da Terra.
Eles acabaram de ser extintos. “Como assim, extintos?”, exclama, indignada e
desconfiada, Agh, minha esposa das cavernas. “Ainda ontem você trouxe um belo Risotossauro
com o qual fiz a janta e só não congelei o resto porque ainda nenhum de seus
amigos inúteis inventou o freezer! Como assim, os dinossauros estão extintos?
Pra mim, você andou o dia todo é no Caverna-Club enchendo a cara com cinza de
vulcão... Não me venha com essa, que quem vai acabar extinto aqui é você”! Bom,
madama, agora desça da árvore e volte comigo às incivilizações da Era Moderna,
à qual pertencemos. O Cenário 2 é essa nossa Caxias do Sul de 2018 depois de
Cristo, quando descobri, aterrado, que os dinossauros acabam de ser extintos também
em toda a cidade.
Sim, madama, andei perambulando por todas as
lojas de brinquedos dia desses, atrás de um ovo que, quando submerso em uma
tigela de água, abre três dias depois e dá à luz um dinossauro esponjoso que
faz a alegria de meu afilhado de seis anos de idade, a quem já brindei com dois
exemplares da espécie e andei prometendo ampliar a família. O que eu não contava
era com a extinção dos ditos-cujos, e minha situação deve ter sido similar à de
Ugh, meu ancestral, que, assim como eu, precisou lidar com a decepção causada
frente ao não cumprimento de uma expectativa gerada. Eu, de minha parte,
comprei um álbum de figurinhas da Copa, a título de plano B. Já Ugh... Nem
imagino o que fez... Talvez tenha se mexido e inventado a telentrega...
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 25 de junho de 2018)