O que queremos ser na vida?
Sabemos que temos somente uma vida para viver (ao menos, essa que estamos
vivendo é só essa, sob essa identidade, nascidos nessa específica configuração
familiar, social, temporal e geográfica) e, por isso, em alguns momentos da
caminhada, impõe-se esse antigo e batido dilema: “o que vou ser quando
crescer”? Ou, também, “agora que cresci, estou sendo aquilo que realmente
desejava e desejo ser?”. Ou, ainda: “mesmo sendo o que sou, ainda posso mudar
de rumo, reinventar-me, ser alguma outra coisa ou, enfim, vir a ser aquilo que
sempre quis?”. Pois é, trata-se de um dilema que, dependendo do caso, pode nos
acompanhar por toda a nossa existência, materializando-se na forma de
frustração ou de realização pessoal. Ou, ainda, como sublimação de desejo não
realizado. Vai saber.
Eu, na minha infância, primeiro
desejava ser bombeiro. Correr pela cidade encarapitado em cima de um flamejante
caminhão de bombeiros reluzindo em vermelho, a sirene aberta abrindo passagem,
rumo ao cumprimento de missões que resultariam no salvamento de inocentes e no
combate a tragédias, era meu sonho. Abandonei o intento no mesmo dia em que vi
com meus próprios olhos uma casa arder em chamas na vizinhança e o perigo real a
que os bravos combatentes do fogo se expunham no cumprimento do dever. Não,
aquilo não era para mim. Seria astronauta, mesmo, igual ao trio Armstrong,
Collins e Aldrin, os primeiros a andarem pela Lua. Fascinava-me observar o céu
à noite, detectar os nomes das estrelas, constelações e planetas que meu avô me
ensinava a identificar. Mas esse sonho caiu por terra quando soube que foguetes
podiam explodir nos testes, como já havia acontecido antes, e eu, hein, tô fora!
Optei então por ser agente secreto, igual ao 007 do Sean Connery. Perguntei a
meu pai o que deveria fazer para me transformar em um deles, e recebi como
resposta bem humorada: “em primeiro lugar, não conta nada pra ninguém”. Achei
difícil seguir a regra e abandonei também essa meta.
No final das contas, me
transformei em jornalista e escritor (atividades em que o foco é contar tudo
para todo mundo). Descobri que a vida, curta como é, precisa ter um foco, não dá
para querer ser escritor, astrólogo, caminhoneiro, cozinheiro, professor,
detetive e gato, tudo ao mesmo tempo. Vive-se apenas uma vida, com foco e
dedicação. As demais, aquelas que poderiam ter sido, mas não foram, a gente
supre vivenciando-as alegremente nas páginas dos livros e nas telas dos
cinemas. Afinal, as artes expressam exatamente nisso o seu valor vital e
redentor. Ufa!
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 6 de agosto de 2018)
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