Qual o melhor termômetro para medir o grau de barbárie ou
de civilização em que se situa determinada sociedade? Como identificar em que estágio
na escala do desenvolvimento humano uma comunidade se assenta? Fácil: basta
detectar em que ponto dessa régua essa sociedade ou comunidade estabelece seu
índice de tolerância frente ao intolerável. Quanto mais tolerante com o intolerável,
quanto mais leniente com as mazelas sociais, mais no fundo do poço do processo
civilizatório se encontra a sociedade em questão. Na outra ponta, quanto mais
seus cidadãos rechaçam o intolerável, criam e respeitam mecanismos de proteção,
de coibição e de punição a seus praticantes, mais civilizada é a sociedade que constroem.
Não é tolerável, por exemplo, a corrupção tomar conta de
todas as instituições públicas e privadas de uma sociedade. Não é tolerável
políticos, legisladores e funcionários públicos de todas as ordens legislarem e
atuarem em causa própria. Não é tolerável agentes privados corromperem os
agentes públicos. Não é tolerável o bullying. Não é tolerável fazer justiça com
as próprias mãos. Não é tolerável a intolerância religiosa, racial, social. Não
é tolerável maltratar animais. Não é tolerável o estupro. Não é tolerável o
crime organizado. Não é tolerável abastecer aviões com combustível contado para
chegar ao destino sem levar em conta quantidades reservas para enfrentar
eventualidades. Não é tolerável a política do ódio. Não é tolerável a agressão
por desavença de trânsito. Não é tolerável qualquer agressão verbal e física. Não
é tolerável fazer vistas grossas ao crime. Não é tolerável dirigir alcoolizado.
Não é tolerável propor criar um evento em que as pessoas se reúnam com o
propósito de dar socos umas nas outras. Não é tolerável achar normal que essa
proposta truculenta receba a inscrição de mais de dois mil interessados em
participar da bestialidade. Não é tolerável assistir de braços cruzados à
barbarização galopante da sociedade em que vivemos.
Quanto mais tolerante com o intolerável, mais afunda a
sociedade na areia movediça da degradação civilizatória. E cada vez mais
difícil fica o processo de resgatá-la de lá. O pensador gaúcho José Hildebrando
Dacanal já alertava, anos atrás, para as consequências do desastre
civilizatório brasileiro: 100 milhões de bárbaros gerados ao longo das últimas quatro
décadas. Pois ei-los aí, em ação. Se formos tolerantes com o intolerável
decorrente da barbárie, nos afogaremos nela quando ainda estivermos (infelizmente)
vivos para ver.
(Crônica publicada no jornal Pioneiroem 12 de dezembro de 2016)
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