A prova irrefutável de que o Papai Noel realmente visitou
na madrugada do Natal a casa de meu afilhado de quatro anos de idade é uma
cenoura que foi mordida por uma das renas que puxam o trenó do Bom Velhinho. Não
há o que discutir quando as evidências falam por si e o peso das provas
equaciona um mistério. O trenó do Papai Noel é puxado por renas. Seis renas,
conforme me explica o afilhado, enquanto me ajuda a destruir a embalagem que
nos impede de acessarmos com rapidez o conjunto de ferramentas de plástico a
ele destinado também pelo Papai Noel, mas que foi deixado na casa dos dindos
para a devida entrega.
São seis renas, portanto, aprendo. E elas devoram
cenouras. Certo. Escuto com atenção. O Papai Noel não desceu pela chaminé
porque não há lareira na casa, mas parece que conseguiu entrar pela janela do
banheiro, enquanto todos dormiam - o que é uma lástima, já que ele desejaria
muito ter visto o Papai Noel chegar e entregar os presentes. Mas a família toda
caiu no sono e foi bem nessa hora que o velhinho resolveu aparecer. Bom, tudo
bem, ao menos, as cenouras para as renas haviam sido diligentemente
posicionadas sobre o balcão da sala, bem à vista do Papai Noel, que tratou de
entregá-las às renas enquanto ele deixava os presentes. As renas ficam com
muita fome enquanto levam o Papai Noel de casa em casa, e é importante deixar
cenouras para elas se alimentarem.
Uma das cenouras, que não foi totalmente devorada, mas que
mantém as marcas das dentadas desferidas por uma das renas, foi guardada como
relíquia pelo afilhado, sob sua cama. Se eu queria ver? Mas claro que eu
queria! Poc poc poc poc... Saiu correndo em desabalada carreira até o quarto,
para voltar empunhando uma longa cenoura coberta de dentadas. Dentadas de rena natalina,
evidentemente, como eu logo averiguava com meus próprios olhos e minha longa
experiência em pistas deixadas pela ação do Papai Noel. Sim, sim, eram dentadas
de rena, não havia dúvidas. Renas do Papai Noel são as que deixam marcas
enormes na cenoura, como essas. De fato, Papai Noel esteve ali de madrugada.
Pena que ele não viu, porque pegou no sono. Bem, fazer o
que... Nem tudo é perfeito nessa vida. Voltamos a desembrulhar as ferramentas
de plástico, em silêncio, a cenoura escorada na parede da sala. “Ano que vem, vou
ficar acordado, para ver o Papai Noel entregar os presentes e as renas comendo
as cenouras”, disse, manuseando o alicate de plástico. Senti firmeza no
propósito. Se eu fico junto? Fico, claro que fico. Também quero ver. Ano que
vem, não posso esquecer das cenouras.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 26 de dezembro de 2016)
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