Uma coisa é obter conhecimento sobre as nuances do mundo pela
leitura de livros. Outra coisa é vivenciar uma experiência que proporcione o
conhecimento antes apenas vislumbrado nas palavras impressas. O exposto
confirma a antiga sabedoria helvética de que “uma coisa é uma coisa e outra
coisa é outra coisa”. Também ilustra a relação dialética conhecida como
“práxis”, pela qual a teoria orienta a prática que, quando posta em prática,
aprimora e calibra a teoria, e assim por diante. Considerações que evocam à
lembrança o símbolo do Tai Chi, aquele círculo dividido ao meio por uma linha
serpenteada, um lado preto, outro branco, contendo em seus extremos bolinhas
pretas e brancas, a branca no preto, a preta no branco, simbolizando o fato de
todo o processo final conter em si a semente do novo processo que se inicia,
permitindo-nos concluir que uma coisa pode não ser outra coisa, mas sempre
remeterá a um vislumbre da coisa outra que ela ainda não é, mas que poderá virá
a ser. Entende?
Pois é, filosofar por conta e risco, sem ajuda
especializada, dá nisso: a mente vira um pião tresloucado batendo contra as
paredes de um labirinto em Creta enquanto se busca a saída antes que o
Minotauro nos agarre e solucione o jantar (o jantar dele, por suposto).
Compartilho esses devaneios com a estimada leitora e o paciencioso leitor após
ter vivenciado, em Uvanova, dia desses, a experiência da vindima. Para mim,
nascido em urbanidades distantes nas quais acreditava-se que leite dava em saquinhos
em prateleiras de supermercado e salame nascia em árvores, tive a oportunidade
de meter a mão na massa (sentido figurado) e auxiliar no processo de
transformação de uva em vinho.
Até então conhecedor apenas da etapa final do ciclo
vinífero (a arrancada da rolha e o verter do líquido perolado nos cálices), esfolei
os dedos embaixo do parreiral cortando os cabinhos dos cachos que lotaram
cestos de vime depois transportados para o porão da casa dos sogros. Lá, alcei
ao topo de um escorregador de madeira as 37 cestas repletas de uvas que iam
sendo mastigadas por um moedor pilotado pelo cunhado. O sumo disso era erguido
em latão pelo irmão do sogro ao alto de um mastel onde se posicionava o próprio
sogro, manuseando um coador, a fazer com que para dentro do mastel jorrasse
somente o líquido das uvas que, em breve, magicamente virará vinho em nossas mesas.
Vinho que, dessa vez, ajudei a fazer, na prática. Entusiasmado,
já anunciei que, ano que vem, quero ajudar a plantar e a colher a bela polenta.
Por alguma razão, me sugeriram voltar aos livros...
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul,em 13 de fevereiro de 2017)
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