As coisas têm lógica, madama, as
coisas sempre têm alguma lógica, mesmo que seja oculta, mas têm. Cabe a nós,
viventes, aprendermos a aguçar os sentidos e tentar detectar as lógicas (às
vezes aparentemente ilógicas) existentes por trás de algumas coisas que nos
intrigam. Por mais inocentes que pareçam à primeira vista, algumas atitudes e
padrões podem estar sendo tomados com a intenção de obedecer a lógicas ocultas
que atendem aos interesses de alguns setores. Algumas, de consequências
inocentes e admissíveis; outras, nem tanto. É nessas outras que mora o perigo.
Atentei para isso dia desses
quando fui ao supermercado cumprir uma lista de compras que resultaria no prato
especial definido para o jantar. Na seção dos hortifrútis, fui dirigindo o
carrinho por entre os setores, atrás das maçãs, dos limões e dos pimentões necessários
para preparar o acepipe que logo mais deleitaria as gustativas papilas minhas e
da esposa (os demais ingredientes já estavam em casa, à espera, conforme a
madama já suspeitou). Foi no momento da pesagem dos produtos, junto à balança
administrada pela sorridente funcionária postada ali no meio do setor, que
percebi haver adquirido somente produtos de cor verde (a maçã era verde, o
pimentão, também, bem como os limões). “Tudo verde hoje!”, exclamou a
funcionária. “Tudo verde, mesmo!”, repeti, surpreso. E saí dali pensando...
Não seria mais fácil para o
consumidor se os supermercados agrupassem por cores os produtos hortifrutigranjeiros
nesses setores? Ali num canto, os verdes (além dos já citados, as alfaces, a
rúcula, as melancias intactas, os pepinos, as abobrinhas...); ali no outro, os
vermelhos (as maçãs, os pimentões vermelhos, os moranguinhos, as melancias
cortadas, as beterrabas...); adiante, os alaranjados (as laranjas, as abóboras,
as cenouras, os mamões...); ao lado, os amarelos (bananas, carambolas, mangas, os
pimentões amarelos, mandioquinhas em cubos...) e assim por diante?
Economizaríamos tempo indo direto à cata de nossas necessidades por cores, ao
invés de perder tempo, como eu, feito mosca tonta, em busca de visualizar onde
diabos meteram dessa vez o repolho-roxo?
Mas não, né madama, a lógica é
exatamente essa: induzir o consumidor a passear por entre todos os setores,
quando então estará sujeito a deparar com uma brilhante e convidativa caixa de
suculentas peras que não estavam na lista, mas que irresistivelmente terão de
ser levadas para casa. Essa a lógica, madama. Nesse caso, inocente, válida, competitiva,
compreensível, simpática, até. Mas tem outras, e essas outras...
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 29 de outubro de 2018)
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