Cem anos atrás, em março de 1919,
morria, em Criúva (hoje distrito de Caxias do Sul), uma bela e jovem moça de 26
anos de idade incompletos, que decidira fazer de sua vida (abreviada devido à
tuberculose, doença incurável e fatal em sua época) uma opção preferencial pela
cultura e pela arte. Proativa, vanguardista e criativa, temperava seu cotidiano
em Porto Alegre e na Serra Gaúcha dedicando-se ao cultivo do espírito,
consumindo e produzindo arte. Era poeta, de brilho e talento reconhecidos nos
meios intelectuais e literários da Capital e da Serra, mesmo não tendo tido
tempo de publicar livro contendo a obra que vinha lapidando com esmero e
dedicação. Chamava-se Vivita Cartier, e seu corpo segue sepultado no Cemitério
do Pontão, em Criúva, inspirando artistas de várias esferas de atuação, ao
longo das décadas, driblando o sempre ameaçador manto do esquecimento.
Vivita Cartier é lembrada e a
essência de sua alma artística é mantida viva porque sua vida e sua obra seguem
falando e inspirando aqueles que reconhecem a relevância vital do cultivo do
espírito humano (por meio das artes e da cultura) na formação da cidadania, na
consolidação de sociedades civilizadas e desenvolvidas e na transformação dos
seres humanos em plenamente humanos. Sua memória vem sendo cultivada por
historiadores, pesquisadores e entusiastas (conhecidos e anônimos, alguns já
falecidos, outros ainda ativos), como João Spadari Adami, Honeyde e Adelar
Bertussi, Mario Gardelin, Mario Vanin, Juventino Dal Bó e Rodrigo Lopes, entre
outros.
A biografia de sua breve vida,
escrita por mim e lançada este ano, suscitou vários artistas a revisitarem sua
história, ampliando as formas de se relacionar com sua essência, como os
músicos da banda Rota Lunar, conduzidos por Selestino Oliveira, que arranjaram
e musicaram alguns de seus poemas, gravando um CD especial; as alunas da Escola
Estadual de Ensino Médio João Pilati, de Criúva, que levaram aos palcos a vida
de Vivita por meio de alguns de seus poemas mais significativos; a fotógrafa
Liliane Giordano, que produziu um ensaio fotográfico e uma mostra abordando
vislumbres da Noiva do Sol (como Vivita era chamada) e o Grupo Teatral Ueba
Produtos Notáveis, que encenou a vida da poeta em um trabalho magistral
protagonizado por Jonas Piccoli e Anile Zilli. A luta empreendida por Vivita há
mais de um século, por mais vida, se transforma em bandeira e símbolo nos dias
de hoje por quem batalha pela manutenção da essência da vida a partir do cultivo
das artes e do espírito, na guerra contra as névoas do obscurantismo.
(Crônica de Marcos Fernando Kirst publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 11 de novembro de 2019)
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