Se santo de
casa continua não fazendo milagre, prefiro concluir que o problema não reside
tanto no santo, mas mais na incapacidade dos fieis de detectar, reconhecer e se
beneficiar com os poderes e os talentos do santo local. Santos e artistas são
as categorias que mais sofrem com essa reincidente ideia de que tudo o que vem de fora é melhor do que aquilo que foi
gestado dentro dos limites geográficos de nossa aldeia, como se nossa aldeia
não fosse capaz de reunir os elementos necessários para a emersão de
genialidades muitas vezes até superiores às dos santos e artistas de alhures.
Dia desses,
madama, presenciei in loco a
repetição do mantra. Estava eu a aguardar algumas pessoas para uma reunião ali
no Centro de Cultura Henrique Ordovás Filho e, como havia chegado antes do
horário, aproveitei para apreciar as duas exposições de artes plásticas que
ocupavam os espaços do ambiente. Uma, em um corredor, abrigava obras de
artistas de Vacaria, compostas por telas que me impressionaram pela
contundência, pela sensibilidade, pelo inusitado. A outra, ocupando a área da
galeria principal, exibia desenhos e telas de um artista carioca, em um
trabalho interessante, mas que me causou pouco impacto. Ao encontrar dois
amigos no saguão, comentei sobre as mostras e recomendei que visitassem
prioritariamente a de Vacaria, por julgá-la superior. Mal terminei de falar e a
dupla se dirigiu direto à mostra do artista carioca. Afinal, era “de fora”. Não
sei se de fato a qualidade dos artistas vacarianos era superior à do carioca,
conforme eu defendia, mas uma coisa é certa: minha credibilidade enquanto
crítico de arte está abaixo das polainas do cachorro.
De minha
parte, sigo convicto de que, em se tratando de arte, a Serra faz milagres, sim,
com a sucessão de talentos e genialidades que gesta em todas as áreas. Só para
embasar, lembremos de Antonio Giacomin com suas aquarelas; de Vasco Machado e
suas telas campeiras; de Rafa Schüler e sua guitarra falante; de Cibele Tedesco
e Alcides Verza com sua maestria na condução de corais; de Zica Stockmans,
Magali Quadros, Cleri Pelizza, João Tonus, Aline Zilli e Jonas Piccoli abrilhantando
nossos palcos teatrais; da música de Selestino Oliveira; dos quadrinhos de
Eduardo Cardoso; do olhar fotográfico de Mauro J. Bettiol e Liliane Giordano; da
escrita de José Clemente Pozenato. E tantos, tantos outros, que chego a me
empanturrar com os milagres que os talentos regionais são capazes de produzir
na minha alma. Tenho o privilégio de residir em uma região cujos artistas me
conectam com o mundo.
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