Estaremos definitivamente perdidos quando abandonarmos nossa capacidade
de sonhar com um mundo melhor. Apesar de todos os horrores, apesar de todas as
mazelas, apesar da escuridão que se abate sobre os dias, apesar das
dificuldades angustiantes, apesar das pedras que brotam no caminho, apesar do
florescer dos ódios e do fenecer da poesia, precisamos nos agarrar à esperança
de que nossos atos pessoais, embasados nos ensinamentos ancestrais pautados
pela ética e pela civilidade, serão capazes de reorientar o rumo do processo,
se somados aos de muitos que não se vergam ao clamor individualista do “cada um
por si”. Sonhar com o melhor é o combustível que nos permite seguir adiante
mesmo quando rodando sobre o pior, que pode sempre ainda pior ficar, como bem
sabemos.
A fim de colocar lenha nesse combustível positivo, vale lembrar o
discurso que o então presidente dos Estados Unidos Franklin Roosevelt proferiu
à sua nação em 6 de janeiro de 1941, quando o mundo se horrorizava com o auge
da Segunda Guerra Mundial, conflito que logo tragaria também os Estados Unidos
para o olho do furacão do combate ao nazismo e ao fascismo. Roosevelt lembrava
os norte-americanos que, caso entrassem na guerra (o que de fato o fizeram), seria
com o objetivo de defender a causa da liberdade, e elencou quatro tópicos que
ficariam conhecidos como “as quatro liberdades humanas essenciais”, a saber: liberdade
de expressão, liberdade de culto, liberdade de viver sem passar necessidade e
liberdade de viver sem medo. Mais tarde, esses conceitos seriam evocados e
influenciariam os termos da Declaração dos Direitos Humanos e da Carta das
Nações Unidas, tamanho o poder definidor das aspirações humanas que possuem.
São aspirações poéticas, elevadas e que embalam bons sonhos, fundamentais para contrapor
a cruel realidade, que conduz cada vez mais para a direção oposta.
No caso do Brasil, a realidade prática aponta para um verdadeiro pesadelo
acordado, diametralmente oposto às quatro liberdades evocadas pelo discurso. A
liberdade de expressão é mal compreendida, mal utilizada e a censura está
sempre rondando; a liberdade de culto (e de crenças e de opções pessoais em
geral) sofre constantes ataques dos intolerantes e cultuadores do ódio e da
discriminação; a de viver sem passar necessidade e a de viver sem medo falam
por si aos corações de cada brasileiro, vergados a uma rotina de miséria,
disparidade social, corrupção e violência. Mas é preciso sonhar e seguir
fazendo nossa parte no cotidiano, para que a maionese não desande por completo.
Se é que já não...
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 16 de abril de 2018)
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