Enfrentando com um sorriso as
expressões de espanto exclamadas em todas as línguas do planeta, o príncipe
Harry não pestanejou, dias atrás, ao decidir chutar o balde, digo, a coroa da
realeza britânica e largar de mão sua participação no elenco capitaneado por
sua avó, a rainha Elizabeth II, para ir reinventar a vida de forma plebeia ao
lado da esposa, a atriz norte-americana Meghan Markle, no Canadá. Harry e
Meghan manifestaram o desejo de viver uma vida normal, ganhando seu próprio
sustento, desvencilhados do aparato advindo da ostentação (e dos impostos) da
coroa britânica, claro que entendendo-se por “normal” aquilo que se pode
antever de uma dupla que passa a enfrentar seus novos desafios já
confortavelmente ancorada em fortunas que nossas vãs filosofias e finanças
sequer sonham.
Mas vá lá: o (ex?) príncipe Harry
surpreende pela ousadia de quebrar uma tradição, enfrentar as adversidades e a
repercussão internacional de seu ato e mergulhar no sonho de ir em busca da
felicidade pessoal. Tudo fica mais fácil, repito, quando se tem uma conta
bancária capaz de ancorar qualquer loucura, mas pelo jeito a questão não era só
essa. Buscar a felicidade é uma prerrogativa lícita e um direito universal,
válida inclusive para príncipes e atrizes hollywoodianas, eu, você e a madama. Que
sejam felizes, então, longe da rainha e sua coroa encravada.
Comungava com Harry o desejo de
buscar uma vida melhor também o menino africano Laurent Barthélémy Ani Guibahi,
de 14 anos, que na semana passada decidiu concretizar o desejo de abandonar seu
país natal, a Costa do Marfim, e reconstruir a vida na França, país que em seu
imaginário de garoto estudioso e bom filho, representava o paraíso na Terra, sabedor
que era da discrepância na qualidade de vida entre as duas nações. Determinado,
pôs seu plano em ação na primeira semana deste ano: fez a pé os 30 quilômetros
que separam sua casa do aeroporto de Abidjan e embarcou como clandestino em um
Boeing da Air France, escondendo-se perigosamente no trem de pouso. Laurent foi
encontrado após a aterrissagem, no Aeroporto Charles de Gaulle, na França,
porém, chegou morto ao destino de seu sonho. Os mundos internos de Harry e
Laurent convergiam no anseio genuinamente humano que pauta a busca pelos sonhos.
Porém, seus mundos concretos divergiam nas condições de que dispunham para viabilizar
esses sonhos. A busca da felicidade tem seu preço, cabe a cada um pesar a
relação entre custos e riscos. Para o pequeno africano, custou a vida. Para
Harry, pouco mais que sustentar o olhar torto da rainha.
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