Quando eu nasci, meio século atrás, na distante e pequena
Ijuí, interior do Rio Grande do Sul, os tempos eram outros, inimagináveis para
gerações já surgidas na era das redes sociais e do fantástico google. Não havia
computadores, não havia internet, nem telefones celulares. “Rede social” era um
fenômeno que acontecia sempre que pessoas em carne e osso se reuniam em família
ou entre amigos em torno de um objetivo humano comum como conversar, jogar
cartas, jantar, dançar, fazer um churrasco, conviver olho no olho, com as almas
presentes junto aos corpos físicos e não distanciadas em mergulhos
autocentrados pelas barafundas viciantes (algumas delas imbecilizantes) dos
meandros proporcionados por aparelhinhos que nos dias de hoje disputam o lugar
de gente de verdade, criando gerações de zumbis.
Não é à toa que os seriados televisivos e filmes que mais
fazem sucesso na atualidade são aqueles protagonizados por mortos-vivos
cambaleantes e babões, com os quais o público parece se identificar plenamente.
Veem-se representados pelos zumbis nos quais estão se transformando do lado de
cá das telas, sempre que optam conscientemente por trocar convivência humana
real por navegação virtual. Fazer o quê? Afinal, não se pode medir as
consequências das invenções tecnológicas que vão surgindo e revolucionando o
mundo, tampouco responsabilizar os inventores pelo mau uso de suas criações.
Quem inventou o fogo pensando em cozinhar as sobrecoxas de mamute não previu
seu uso posterior por Nero no incêndio deliberado de Roma. Quem inventou o
avião para encurtar distâncias não imaginava seu uso bélico na destruição de
cidades por bombardeios aéreos. Quem criou o automóvel não tem culpa na
mortandade do trânsito irresponsável. Quem inventou a internet, as redes
sociais e os aparelhinhos portáteis que lhes dão acesso ilimitado e onipresente
não pensava em gerar zumbis.
Porém, basta olhar em volta para sentir-se imediatamente
imerso dentro do cenário de “The Walking Dead”, porque a instalação da
Zumbilândia caminha a passos largos e firmes, embalada no cambalear trôpego dos
que preferem abandonar sua própria humanidade em benefício da vida virtual.
Tudo o que é em demasia preocupa. Perder a medida do uso é o que gera a doença.
Até ar demais pode explodir o pulmão. Água cristalina em demasia pode afogar.
Internet e rede social em excesso imbeciliza e gera zumbis, sim. Mas nunca é
tarde para acordar, afinal, como mostram os seriados, até contra zumbis existem
antídotos. Nesse caso específico, o antídoto é a opção pela vida real.
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 27 de março de 2017)
Nenhum comentário:
Postar um comentário