Queríamos ganhar dinheiro. A mesada que recebíamos de
nossos pais não estava sendo suficiente para suprir nossas necessidades
adolescentes. Eu, por exemplo, desejava adquirir logo todos os livros de
Monteiro Lobato que ficavam expostos nas prateleiras da Livraria Progresso, bem
como colecionar todos os títulos de gibis dos heróis Marvel que surgiam
mensalmente na banca de revistas também batizada de Progresso. Havia muito progresso
na nossa Ijuí natal (Rádio Progresso, Armazém Progresso...) e queríamos também
progredir, meu primo e eu. O que ele planejava fazer com sua parte do futuro
dinheiro que ganharíamos, eu nunca soube, mas um propósito nos unia:
empreender.
Tínhamos a mesma idade (ainda temos), cursávamos a mesma
classe na escola e, por volta dos 15 anos (início da década de 1980), sentamos
para planejar. O pai de um colega, dentista famoso na cidade, instalara uma
criação de coelhos em sua chácara e fomos lá visitar o empreendimento, cujo
mercado era promissor. Achamos aquilo relativamente fácil de administrar e decidimos:
criaríamos coelhos (estávamos convictos de que ficaríamos ricos vendendo ovos
de páscoa, se alimentássemos e treinássemos bem aqueles coelhos). Meu pai
liberou um pedaço do terreno nos fundos de casa para instalarmos ali o futuro
viveiro. Pegamos enxadas numa tarde de sol e limpamos a área onde ergueríamos
as gaiolas. Agora só faltava construí-las e adquirir os coelhos.
Mas precisávamos de dinheiro para o investimento inicial,
o tal do capital de giro. Verificamos nos bolsos que nosso capital não girava
além de algumas moedas sobradas de troco dos gibis e das merendas. Tínhamos
primeiro de fazer dinheiro para investir no empreendimento que, depois, nos
traria fortuna. Que coisa complicada essa vida de capitalistas! Mas fomos em
frente. Aceitamos trabalho temporário de dois meses, nas férias, para
administrar uma lojinha de especiarias pertencente a um tio-avô enquanto ele
veraneava no litoral. Guardaríamos os salários para construir as gaiolas e
comprar dois casais de coelhos, torcendo para que se reproduzissem com rapidez
(não lembro de termos orçado as cenouras e as couves).
Na segunda semana de trabalho, meu primo derrubou ácido
acético no pé e teve de ser substituído por outro colega. Meu sócio, então,
retirou-se do projeto, que acabou naufragando junto com os salários devidamente
torrados em gibis, livros e lanches. Nenhum de nós jamais criou coelhos. Quem
saiu no lucro foi meu pai, com a roçada gratuita que fizemos no terreno de casa.
Aprendemos que empreender não é brincadeira.
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul,em 21 de agosto de 2017)
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