A primeira música dos Beatles que eu escutei na minha vida, tenho certeza, foi “Drive My Car”, e não foi por causa dela que eu me tornei um beatlemaníaco, mas foi justamente por causa dela que eu me tornei um beatlemaníaco, se é que dá para entender. Não, acho não dá para entender, então por isso é que eu explico, para quem porventura quiser saber.
Aconteceu lá nos idos de 1966 na Rua dos Viajantes, na casa que meus jovens pais haviam adquirido nas cercanias do centro da simpática cidade de Ijuí, interior do Rio Grande do Sul. Região de terra vermelha, conhecida como tabatinga, e de calores escaldantes no verão e de frios arrepiantes no inverno, temperadíssima, moldando espíritos que se acostumavam a não se acostumar com nada, a começar pela falta de constância do tempo. Andava eu, naqueles dias, a chorar à larga e a espernear bastante, careca, banguela e pelado, fazendo jus e usufruindo de todos os direitos que reconhecia serem meus pelo fato de ser um bebê recém-nascido, e também por restar-me apenas isto a fazer frente às óbvias negativas de meu pai em me emprestar a chave do carro nas condições em que eu ainda me encontrava naquela fase da vida. Que fazer para acalmar a criança?
Simples: ligar a vitrola Telefunken puxando para trás o braço da agulha e fazendo assim rodar automaticamente o prato, pronto para receber bolachas de discos de vinil, cujo som se faria projetar pela sala a partir da única caixa mono instalada no canto ao lado da lareira. E dê-lhe Beatles a ecoar entre as quatro paredes, eu no colo sendo acalentado ora pelo pai, ora pela mãe, e acalmando-me junto à sucessão das faixas de Rubber Soul, disco lançado um ano antes e recém-chegado nas prateleiras das lojas Discolândia e Cifosom em Ijuí, para deleite dos jovens de vinte-e-poucos-anos daquela época, meus pais incluídos, e também meu padrinho que me deu este e outros bolachões de presente de batismo.
Duvido muito que eu pegasse no sono já na abertura do disco, com a guitarra fazendo o inconfundível solo que antecede os versos “Asked a girl what she wanted to be/ She said baby, can´t you see?”... Mas talvez eu já me acalmasse um pouco quando George empunhava a cítara na segunda faixa, para permitir John revelar que “I once had a girl, or should I say, she once had me”... Acho que abria os olhos e resmungava um pouco quando os vocais de John Paul e George começavam a se alternar em “You won`t see me”, e seguiam fazendo composições harmônicas inigualáveis já na abertura da quarta faixa, com “He´s a real nowhere man...”. O fato é que eu me acalmava, dormia, era acalentado ao som de Beatles com seu Rubber Soul e suas 14 faixas altamente recomendáveis para acalmar bebês, entre outras setecentas mil indicações.
O que aconteceu depois é outra história, cheia de idas e vindas, mas um autêntico beatlemaníaco nasceu ali, escutando, mesmo sem o saber, “Drive my car”, que não é, nem de longe, a minha preferida deles hoje. Mas tenho certeza de que era a de meus pais, 44 anos atrás, em noites quentes ou geladas em Ijuí, quando uma criança chorona tinha de ser acalentada antes que o refrão “cry, baby, cry” se tornasse indigesto.
Aconteceu lá nos idos de 1966 na Rua dos Viajantes, na casa que meus jovens pais haviam adquirido nas cercanias do centro da simpática cidade de Ijuí, interior do Rio Grande do Sul. Região de terra vermelha, conhecida como tabatinga, e de calores escaldantes no verão e de frios arrepiantes no inverno, temperadíssima, moldando espíritos que se acostumavam a não se acostumar com nada, a começar pela falta de constância do tempo. Andava eu, naqueles dias, a chorar à larga e a espernear bastante, careca, banguela e pelado, fazendo jus e usufruindo de todos os direitos que reconhecia serem meus pelo fato de ser um bebê recém-nascido, e também por restar-me apenas isto a fazer frente às óbvias negativas de meu pai em me emprestar a chave do carro nas condições em que eu ainda me encontrava naquela fase da vida. Que fazer para acalmar a criança?
Simples: ligar a vitrola Telefunken puxando para trás o braço da agulha e fazendo assim rodar automaticamente o prato, pronto para receber bolachas de discos de vinil, cujo som se faria projetar pela sala a partir da única caixa mono instalada no canto ao lado da lareira. E dê-lhe Beatles a ecoar entre as quatro paredes, eu no colo sendo acalentado ora pelo pai, ora pela mãe, e acalmando-me junto à sucessão das faixas de Rubber Soul, disco lançado um ano antes e recém-chegado nas prateleiras das lojas Discolândia e Cifosom em Ijuí, para deleite dos jovens de vinte-e-poucos-anos daquela época, meus pais incluídos, e também meu padrinho que me deu este e outros bolachões de presente de batismo.
Duvido muito que eu pegasse no sono já na abertura do disco, com a guitarra fazendo o inconfundível solo que antecede os versos “Asked a girl what she wanted to be/ She said baby, can´t you see?”... Mas talvez eu já me acalmasse um pouco quando George empunhava a cítara na segunda faixa, para permitir John revelar que “I once had a girl, or should I say, she once had me”... Acho que abria os olhos e resmungava um pouco quando os vocais de John Paul e George começavam a se alternar em “You won`t see me”, e seguiam fazendo composições harmônicas inigualáveis já na abertura da quarta faixa, com “He´s a real nowhere man...”. O fato é que eu me acalmava, dormia, era acalentado ao som de Beatles com seu Rubber Soul e suas 14 faixas altamente recomendáveis para acalmar bebês, entre outras setecentas mil indicações.
O que aconteceu depois é outra história, cheia de idas e vindas, mas um autêntico beatlemaníaco nasceu ali, escutando, mesmo sem o saber, “Drive my car”, que não é, nem de longe, a minha preferida deles hoje. Mas tenho certeza de que era a de meus pais, 44 anos atrás, em noites quentes ou geladas em Ijuí, quando uma criança chorona tinha de ser acalentada antes que o refrão “cry, baby, cry” se tornasse indigesto.
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