segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O tolo e o gênio


A história deu-se mais ou menos assim: o sujeito arrastava as botas cheias de areia pelo deserto de Góbi (existem mais desertos no mundo além do Saara para ilustrar uma história dessas) quando, de repente, chutou sem querer um artefato que fez pléin e voou longe, reluzindo ao sol escaldante. Convencido de que não se tratava de uma miragem, uma vez que já fora acometido nas últimas três horas por miragens que se apresentavam na forma de Giseles Bündchens dançando tchá-tchá-tchá e que se esvaneciam no ar quando tentava tocá-las, nosso herói desviou-se de seu tortuoso trajeto em ziguezague e foi ao encalço do objeto que, ao enlaçá-lo entre as mãos, percebeu tratar-se de uma lâmpada típica daquelas que costumam conter gênios encantados nas histórias que se passam em desertos sob sóis escaldantes e climas tórridos.
Ato contínuo, pôs-se a esfregar a lâmpada como se a lustrasse, pois que nosso herói era suficientemente letrado em histórias em quadrinhos e em televisão para saber que um gênio só é expelido de lâmpadas mágicas após um vigoroso lustre. E não deu outra: subitamente, pof! Surgiu o gênio da lâmpada maravilhosa, ofertando ao até há instantes desafortunado e agora sortudo herói de nossa história a realização de três desejos, quaisquer que fossem, mas que pedisse rápido porque ele próprio desejava retornar ao interior aconchegante da lamparina e retomar seu sono milenar, porque justo agora aparecera em sonho Gisele Bündchen dançando tchá-tchá-tchá.
Nosso herói não titubeou um segundo sequer e tascou-lhe o primeiro pedido: “Desejo uma garrafa de Tota-Tola que nunca esvazie, por mais que eu beba”. O gênio fez assim com o dedo e puftluf! Lá estava na mão de nosso sedento herói a garrafa do refrigerante, que ele esvaziou em uma dezena de goles. Instantaneamente, zupt! A garrafa estava novamente cheinha de Tota-Tola, conforme ele pedira. Restavam dois desejos, e nosso intrépido andarilho não teve dúvidas: pediu mais duas garrafas intermináveis de Tota-Tola!
É uma piadinha tola, eu sei. Todos os que a escutam riem-se (quando riem) da tolice do herói, tido como o símbolo, a encarnação e o resumo da estupidez humana. Já eu vejo a fabulazinha sob outro viés, claro, e é por isso que escrevo. E se, ao invés de ser ele o maior tolo da Terra, nosso herói for, na verdade, um símbolo de generosidade e desprendimento? Sim, porque, ao pedir ao gênio outras duas Tota-Tolas intermináveis, quero crer que ele pensava em presentear duas pessoas queridas com aquela maravilha! Ele é, isso sim, uma boa alma, seu bando de perversos. A moral da história seria tipo assim: fuja do senso-comum, busque ver as coisas sob um novo viés, sempre que possível, sacou?
Mas que ele podia ter usado um dos pedidos para sair daquele deserto, ah, isso eu concordo que podia...
(Crônica publicada no jornal Informante, de Farroupilha, em 7 de janeiro de 2011)

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