Blog destinado à publicação de crônicas e textos assinados pelo jornalista e escritor Marcos Fernando Kirst em jornais e revistas, além de textos aleatórios quando for o caso.
sexta-feira, 1 de abril de 2011
Que dia é hoje
Sou insistentemente contra essa imposição mercantilista que o comércio força sobre as pessoas, transformando datas especiais em pretextos para a gastança. Natal não é mais um convite para a reunião em família e a reflexão sobre a saúde dos valores humanos que regem nossas vidas (se é que eles ainda existem). Páscoa deixou de ser um momento em que a reflexão interior também ganha espaço e mesmo a tradicional brincadeira de procura pelo ninho escondido pelo Coelhinho já se esfumaça na memória dos mais velhos. Aniversário, dia das mães, dia dos pais, dia do amigo, tudo virou pretexto para comprar presentes, como se essa fosse a única maneira aceitável na atualidade de demonstrar afeto, carinho, consideração, lembrança. Como se não bastasse, até o norte-americano Halloween (o dia das bruxas) já estamos importando, bem como o Valentine’s Day, que nem sei direito de que se trata e, por favor, não se preocupem em me explicar, que pouco se me dá. Tudo, claro, para amplificar o tilintar dos cobres nas caixas registradoras do comércio e da indústria. Para aquecer a economia. Para gerar empregos e coisa e tal. Tudo muito lindo, sou a favor de aquecer a economia e de gerar empregos e coisa e tal, e como é que poderia ser contra? O que me preocupa é a subserviência pacífica, o comportamento de boiada que nos habituamos a adotar frente ao estímulo mais raso, ante a mais leve convocação do sistema para que gastemos. Se eu não der um presente para a minha mãe no dia das mães, é sinal de que não amo a minha mãe como deveria, correto? Pois é. É isso aí, seu desalmado. Monstro. Insensível. Filho ingrato, mau, horroroso. Como é que dorme à noite? Levanta, vai lá, compre um presente (de preferência, bem caro) e escancare o tamanho de seu amor. Caso contrário, se ficar só no sentimento, só naquela coisa de coração, ninguém vai ver, né? Pois é. É isso aí. Existe algo mais discriminatório do que o Dia Internacional da Mulher? Reservar um dia entre os 365 do ano para reverenciar as mulheres é consolidar a visão discriminatória que a sociedade nutre sobre o gênero feminino. Homens e mulheres devem lutar por igualdade e não por discriminação. Quer ser romântico e amoroso, seja-o hoje, amanhã. Surpreenda. Ludibrie o sistema, os comerciantes, e encante a quem você ama por você mesmo, não por imposição, não por obediência ao calendário. “Eu amo muito a minha mulher no Dia da Mulher. É quando mando flores para ela”. Que amor, você... Mas nada contra presentear. Eu adoro dar e receber presentes. Mas tudo contra a obrigação e a mercantilização dos sentimentos. Tudo contra a cobrança e a deturpação do real sentido e da real dimensão das coisas. Alice, a do País das Maravilhas, ensinou a celebrar o Dia do Desaniversário, pois não? É uma alternativa a se pensar... Ah, hoje é primeiro de abril, dia dos bobos, da mentira, lembra? Será que é só hoje mesmo...? (Crônica publicada no jornal Informante, de Farroupilha, em 1 de abril de 2011)
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