Tive o privilégio, dias atrás, de presenciar boa parte do bate-papo
protagonizado pela jornalista e escritora Eliane Brum em um dos estimulantes
encontros entre autores e leitores promovidos pela Feira do Livro de Caxias,
que encerra sua 28ª edição neste domingo. Permeada por uma lucidez cativante e por
uma sensibilidade profunda, a palestra rendeu-me anotações em um bloquinho,
efetuadas com o intuito de me servirem de alimento para reflexões posteriores.
Em dado momento, Eliane ponderou assim: “à medida que envelhecemos, o
mundo da gente vai morrendo antes de nós”. A frase foi um gancho disparado
direto contra o queixo de minha essência, moldada por uma natureza nostálgica e
memorialista. Tem razão a Eliane ao conseguir sintetizar e traduzir, de forma
quase tangível, uma sensação que norteia silenciosa e anonimamente a minha
relação com o mundo desde há muito tempo. É exatamente isso o que percebo
ocorrer no entorno de mim mesmo à medida que os anos se vão empilhando na
canastra de minha memória. Agora, essa sensação tem nome, ou, ao menos, conta
com uma frase muito bem composta, capaz de defini-la em meus devaneios.
Morrem, sim, partes do meu mundo quando deixam a vida pessoas queridas de
meu círculo, personagens reais que se vão para nunca mais voltar. Morrem também
pedaços de meu universo quando se vão meus ídolos, mas, principalmente, vejo
meu mundo se apequenar quando percebo o processo acelerado de extinção de
valores que me eram e são caros, e que parecem não significar mais nada para a
maioria daqueles que povoam o mundo físico que compartilho. Morre meu mundo com
o desinteresse pela leitura e pela cultura; morre meu mundo com o
individualismo exacerbado das pessoas; morre meu mundo com a caça faminta ao
dinheiro e ao status; morre meu mundo sempre que a má-educação e a violência
passam a dar o tom do convívio social; morre meu mundo quando o virtual fala
mais alto do que o real; morre meu mundo quando o aperto de mão e o sorriso são
substituídos pelo “curtir” do feicibúki.
A lucidez humana e sensível de uma Eliane Brum, pelo menos, me ajuda a
seguir morrendo aos poucos sem a sensação de estar assim tão só em um mundo que
gigantemente se apequena.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 12 de outubro de 2012)
3 comentários:
Marcos,
Grande texto!
"...vejo meu mundo se apequenar quando percebo o processo acelerado de extinção de valores que me eram e são caros, e que parecem não significar mais nada para a maioria daqueles que povoam o mundo físico que compartilho. Morre meu mundo com o desinteresse pela leitura e pela cultura; morre meu mundo com o individualismo exacerbado das pessoas; morre meu mundo com a caça faminta ao dinheiro e ao status; morre meu mundo sempre que a má-educação e a violência passam a dar o tom do convívio social; morre meu mundo quando o virtual fala mais alto do que o real; morre meu mundo quando o aperto de mão e o sorriso são substituídos pelo “curtir” do feicibúki"
Assino embaixo! É bom saber que não estou sozinho nisso.
Um abraço
Guilherme
Adoro a Eline Abrum.
E gostei muito deste teu texto.
O virtual tem falado mais alto que o real no nosso caso, mas, ainda assim, sou grata por existir o virtual.
Bjs
Rafaela
Concordo, Rafaela. Tambem rendo minhas loas ao mundo digital e virtual... Mas como tudo, a moderaçcao e o bom senso no uso seguem sendo as bases...
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