(Isso aí, Lucélia, a gente não quer só comida...)
A atriz Lucélia Santos deu uma aula de lucidez durante entrevista concedida
aos jornalistas que integravam a bancada do programa “Roda Viva”, na Tevê
Brasil, na noite da última segunda-feira. Intensa, corajosa e sincera, fez jus,
com suas declarações, à visão que o escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues tinha
dela, ao conceituá-la como não sendo apenas uma pessoa, mas, sim, “uma força da
natureza”. E que força!
Sim, Lucélia, no surpreendente viço e frescor de seus 55 anos (parece ter
não mais de 35), é um redemoinho de ideias e opiniões sobre a vida e a
sociedade que merecem atenção e convidam a refletir sobre os rumos que estamos
tomando enquanto humanidade. A certa altura da entrevista, a atriz (uma
verdadeira livre pensadora que, de “escrava”, só tem relação mesmo é com o
papel que a consagrou na televisão, 36 anos atrás) discorreu sobre a pretensa
conquista social obtida pelos últimos governos federais pós-regime militar, que
se converteu na criação de uma classe média com poder de consumo capaz hoje de realizar
sonhos materiais como a aquisição de automóveis, de casa própria e de
parafernália eletrônica como televisores, notebooks, tablets, câmeras
fotográficas digitais etc. Mas ao mesmo tempo em que gastam e consomem, os
integrantes dessa estrondosa maioria de cidadãos (acompanhados pelas demais
classes sociais brasileiras) se afastam dos processos de edificação pessoal só
possíveis de serem conquistados por meio da educação, da cultura e da arte.
“Que espécie de sociedade de consumo desejamos, afinal? Os brasileiros,
travestidos de consumidores, estão virando cidadãos acéfalos, burros,
aculturados, superficiais, ocos. Deveríamos estimular e incentivar o surgimento
de uma classe consumidora de cultura. O que eu desejo para as pessoas é isso:
mais cultura, mais arte, mais leitura, mais natureza”, metralhou, certeira, a
atriz. Lucélia Santos sonha em ver os brasileiros lendo livros, frequentando o
teatro, apreciando exposições de arte, refletindo sobre a existência, gerando e
debatendo ideias, refinando seus espíritos, transformando-se em cidadãos
transformadores. Ela é uma lúcida voz solitária a semear em um deserto cada vez
mais amplo.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 26 de outubro de 2012)
Nenhum comentário:
Postar um comentário