sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Mágica nenhuma


Na hora do banho, como já revelei em crônica passada, minha mente vaga por searas esdrúxulas e se põe a meditar sandices. Esta semana, dei de ficar encasquetado com a questão do olho mágico, aquele artefato encravado nas portas de entrada dos lares cuja função seria a de permitir que os moradores identifiquem com segurança quem toca a campainha e deseja adentrar nossos domínios. Ora, pois, refleti eu, ensaboando a cabeça, trata-se de um dos mais inúteis objetos já produzidos pela inventividade humana, e explico por quê.
Pelo simples motivo de que não serve para nada, uma vez que, ao você meter o olho (o seu) no olho (o mágico), a imagem que lhe chega é uma monstruosidade distorcida, semelhante ao que se vê na sala dos espelhos dos parques de diversões. Impossível identificar, via olho mágico, quem está à porta. Você apenas detecta que, sim, é verdade, a campainha não tocou sozinha e você não está escutando batidas fantasmagóricas, existe mesmo alguém ali fora querendo entrar, mas definitivamente é impossível saber de quem se trata.
A não ser que a Estefânia tenha telefonado meia hora antes e dito: “Roxane, estou indo dar um pulinho aí daqui a pouco”. Aí, dali a um pouco, toca a campainha, você confere pelo olho mágico e vê que encontra-se ali, dando um pulinho, a imagem de alguém que parece ser, sim, remotamente, com aquilo que costuma ser a Estefânia. E abre-se então a porta, mais por consequência de uma conexão lógica de fatos do que devido à funcionalidade do olho mágico.
Os defensores do aparelho (os fabricantes e os instaladores de olhos mágicos) retrucarão que o objeto permite você se fazer de morto e fingir não estar em casa quando aquele indesejável aparece repentinamente para cobrar uma dívida ou tirar alguma satisfação. A réplica faria sentido caso fosse possível identificar a pessoa (o que já demonstramos ser impossível), mas mesmo assim o argumento é falho, uma vez que o visitante que está do lado de fora percebe a sombra do morador metendo o olho no olho pelo lado de dentro, o que prova que você está lá. O melhor será abrir a porta para evitar escândalos no corredor.
E, de quebra, cimentar o olho mágico da porta.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 11 de fevereiro de 2011)

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