Gosto de agosto. Não compartilho
da crença popular que atribui ao oitavo mês do ano a pecha de período aziago,
pelo que cunharam e repetem à exaustão a expressão “mês do desgosto”. Eu, com
essa minha mania de embrenhar-me pela contramão (sempre a pé, jamais no
trânsito), desconcordo do desgosto e gosto de agosto, a meu gosto.
Sim, porque agosto me parece que
traz uma espécie de recarga vital de nossas energias psíquicas. A típica
correria de início de ano, que no Brasil se inicia com o término do Carnaval,
finalmente já passou, as férias foram cumpridas e também já solucionamos o
corre-corre da volta às aulas e os presentes da Páscoa e os do Dia das Mães e
já fomos a Caravaggio e já sabemos quem venceu o Gauchão, o Brasileirão está
encaminhado, Copa do Mundo só daqui a quatro anos e para as Olimpíadas ainda
faltam dois (o que, em nossa tendência para deixar tudo para a última hora,
ainda é uma eternidade), enfim, a lista de afazeres a fazer começa a ser menor
do que a relação dos afazeres já feitos.
Chega agosto e já estamos
definitivamente habituados ao novo ano, que de novo não tem mais nada. Já
vestimos a camiseta de 2014 e trancafiamos definitivamente 2013 nos cofres da
memória. O novo ano ainda se situa a uma distância regulamentar plausível, sem
ameaças ao aumento de nossos níveis de ansiedade e se configura como um futuro inexorável,
mas ainda distante, em relação ao qual não precisamos dispender maiores
energias, a exemplo do prêmio da megassena que seguramente ainda vamos tirar um
dia, a aposentadoria, a velhice, a morte, essas coisas todas que o escritor
argentino Jorge Luis Borges não hesitaria em classificar como “seres
imaginários”.
Mas agosto está aí, estamos nele
e ele é bem palpável. É em agosto que nos tornamos irremediavelmente cidadãos
do nosso tempo: somos 2014! É agora, por exemplo, que damos aquela paradinha
básica para recuperar o fôlego e detectar, na lista de metas elencadas no afã e
no embalo do champanhe do Ano-Novo recém-passado, aquelas que definitivamente
não é nesse que iremos cumprir.
Agosto está para o calendário do
ano assim como os 15 minutos de intervalo estão para a partida de futebol. Com
a diferença de que, na vida real, não temos tempo para trocar a camiseta e
rever as táticas para chegar ao gol. O gol da vida segue sendo o mesmo e a
tática infalível é conhecida de todos: respirar fundo e seguir em frente, que
logo, logo, entra setembro...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 7 de agosto de 2014)
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