Ultimamente tenho me dedicado à leitura de maus livros. Cuido de ressaltar que o adjetivo “mau” aqui empregado é no sentido de “coisa ruim”, mesmo, e não no de elemento portador de malvadeza. Os livros aos quais tenho dado atenção caracterizam-se, portanto, pela parca qualidade literária que apresentam: estilo pobre, tramas inverossímeis, personagens mal-construídos, anacronismos gritantes, adjetivações excessivas, presença constante e incômoda de advérbios e por aí afora. Livros ruins, mesmo. Horrorosos. Tristes de ler. Pobres. Sofríveis.
As razões que me levam a tal empreitada não residem em nenhum traço masoquista que porventura possa estar se originando em minha personalidade, ao contrário do que podem pensar meus mais afoitos desafetos (aquela massa de desafoitos). O fato é que me conscientizei de que, ao ler com tanto afinco os maus livros, acabo conseguindo clarear as virtudes que existem nas obras assinadas pelos realmente bons autores. Ou seja: são os defeitos existentes nos livros ruins que me fazem perceber as virtudes dos bons livros, sendo que a mais importante destas últimas é a ausência absoluta daqueles primeiros. Se é que, por meio destas minhas sempre tão mal-traçadas, me faço entender.
Se não, explico-me e resumo-me: a maior virtude dos bons livros é a ausência dos defeitos que impregnam e caracterizam os maus livros. Escrever bem, descobri a partir de meu abnegado e doloroso empreendimento (sim, às vezes, ler dói, acredite), é escrever com simplicidade, o que não significa, nem de longe, ser simplório. Escrever bem é uma atividade que prescinde do uso estabanado de adjetivos, é resistir à luxúria de resgatar dos grotões da gramática termos e expressões ermos, herméticos e pomposos, e optar pelos simples. Escrever bem não é exibir contorcionismos linguísticos nem empreender arqueologia gramatical. Escrever bem é fazer como Alberto Moravia em “A Romana”, por exemplo, empregando na narrativa uma linguagem simples e cotidiana para contar a saga simples e cotidiana da simples e cotidiana personagem principal da história.
Mas que difícil que é escrever simples! E, por conseguinte, que difícil que é escrever bem. Como é mais fácil resvalar na tentação do ser pomposo, de usar um estilo rococó e pavonear uma suposta destreza na distribuição impune de adjetivos antes e depois de cada desavisado substantivo que ouse passear ingenuamente em meio às páginas de tristes autorias. Crime ecológico, a meu ver, é derrubar tanta árvore para imprimir tanta porcaria por aí afora. Anos atrás uma árvore caiu sobre uma barraca de livros da Feira do Livro de Porto Alegre. Interpretei o ato como um protesto da árvore contra eventuais más impressões que estivessem sendo oferecidas ao público naquela barraca. Tratava-se de um sinal. De minha parte, desde então, prometi tentar aprender alguma coisa, e é por isso que leio tanto.
(Crônica publicada no jornal Informante, de Farroupilha, em 25/06/2010)
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