A data de 27 de março é
reservada para celebrar, no Brasil, o Dia do Circo, essa arte mambembe que me
parece andar meio em extinção por não conseguir se impor em termos de
atratividade frente à concorrência desleal concretizada pelos aparelhos
eletrônicos e pela vida virtual que dão as tintas para o universo infantil deste
início de novo milênio. Eu, que sou um ser de eras passadas, que ainda faz
coisas como ler livros, ficar sentado em bancos de praças, conversar cara a
cara com as pessoas, reservar momentos de cultivo ao silêncio, ainda guardo na
lembrança uma relação vívida com os espetáculos circenses, quando a cidade de
lona começava a ser erguida no alto do morro, lá em Ijuí, inundando minha alma
de expectativas para o final de semana.
Ijuí, naquelas décadas de minha
infância (anos 70 e 80), foi brindada algumas vezes com o suprassumo circense
da época no Brasil: o Circo Orlando Orfei, comandando pelo italiano que lhe
dava nome, aqui radicado. Minha casa ficava a cerca de 300 metros do local destinado
à instalação dos circos, e lembro até hoje de adormecer em meu quarto escutando
ao longe o rugir dos tigres e leões e o bramir dos elefantes. Era um tempo em que
animais selvagens eram permitidos no picadeiro e meus olhos infantis se
deslumbravam com o destemor dos domadores na jaula dos leões fazendo aquelas
feras pularem, dançarem, empilharem-se umas sobre as outras. O elefante chutava
bola; cachorrinhos jogavam uma partida de futebol; o mágico tirava pombas da
cartola; as trapezistas (lindas, esguias, as primeiras a povoarem meus sonhos
adolescentes) voando perigosamente no ar; os malabaristas; a voracidade do
engolidor de espadas e de fogo; o equilibrista na corda-bamba; o ronco infernal
das motocicletas envenenadas dentro do globo da morte; a insanidade ingênua dos
palhaços; a pipoca, a maçã do amor, o algodão-doce.
Tudo isso ficou para trás junto
com a infância. No final dos anos 1990, já editor de Variedades do jornal
Pioneiro, tive o privilégio de entrevistar Orlando Orfei quando esteve em
Caxias com seu circo, aquele meu ídolo da infância. Hoje, aos 93 anos de idade,
sei que segue vivo e aposentado, no interior do Rio de Janeiro. Não deve ter
noção do número de crianças que fez felizes nesse país ao longo de sua longa
vida.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 27 de março de 2015)
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