Meu avô pontua a passagem de
seus aniversários com a construção de uma imagem muito particular. “Completei
mais uma volta ao redor do Sol a bordo do planeta Terra”, diz ele, a cada mês
de setembro, no dia em que faz anos. Firme nessa maratona da vida, daqui a
alguns meses, portanto, completará a sua 92ª volta. Entre as pessoas das minhas
relações, ele é uma das que andam nas primeiras fileiras dessa corrida contínua,
lutando pela pole position. De qualquer forma, já tem assegurado lugar no pódio
da longevidade, da sabedoria, do acúmulo de experiências e de histórias a
contar.
Eu também sigo a minha corrida
particular, muitas voltas atrás dele, procurando me manter a passo firme e
ritmado, para não correr o risco de acabar ficando para trás e ser ultrapassado
como retardatário. A imagem da corrida, ou da maratona contínua, usada para
fazer referência à vida, a esse somatório de dias, horas e minutos que vamos
acumulando para a construção de nossas histórias pessoais, acho que funciona
bem e vem a calhar mesmo. Especialmente nesses tempos modernos, em que é comum
usarmos a expressão “correria” para aludirmos ao nosso cotidiano atribulado. “Oi,
como vai você?”, perguntamos, prontos para receber do interlocutor a
resposta-padrão: “Naquela correria de sempre”.
E corremos todos, sem exceções,
já que a agenda lotada de compromissos não é mais um privilégio dos altos
executivos das bolsas de valores. A fim de garantirmos um mínimo de valores em
nossas próprias bolsas, precisamos, sim, correr todos. E corre a dona-de-casa e
corre a executiva; e corre o trabalhador e correm seus filhos; e correm os
aposentados e a turma da terceira idade; corre o bancário, o professor, o
empresário, o estudante, o jovem, o maduro. Periga até o Rubinho Barrichelo
andar correndo, agora que abandonou a Fórmula-1, e isso é maldade minha, claro,
eu não iria resistir por muito tempo sem uma dessas.
Até meu afilhado de quase três
anos de idade já corre. Ao me ver, coloca-se em posição de largada e anuncia:
“Dindo, uma corrida está começando”, e se bota a correr corredor afora com as
perninhas fazendo poeira ao dindo velho que vem resfolegando atrás, perdendo
sempre todas as corridas que ele anuncia. Não dá para competir com quem está
com todo o gás rumo à sua recém terceira volta em torno do Sol...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 25 de março de 2015)
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