Ao longo dos séculos em que
manifestou seu auge e esplendor, o Império Romano ditou as regras de conduta em
boa parte do mundo conhecido de sua época, subjugando diversos povos ao poder
que vinha da Roma dos césares. Mas, devido a uma complexa conjunção de fatores,
sobre os quais até hoje os historiadores se debruçam para tentar compreender,
teve início um longo processo de decadência que resultou na extinção não só do
poder de Roma, como também da língua que eles falavam, de seus deuses e da
maioria de suas crenças e costumes. Ou seja: a decadência, quando pega, produz
terra arrasada mesmo. É preciso tomar cuidado.
Frente a isso, eu me pergunto se
estamos conseguindo detectar os sinais que podem indicar o início do processo de
decadência da sociedade em que vivemos. Eu, pra variar, fico achando pelo em
ovo e colecionando pistas a cada vez que acordo e vou para a vida neste mundo
em que estamos inseridos (e ajudando a construir). Um dos sinais da decadência
de nossa era - essa nossa era da exposição pessoal gratuita a qualquer preço –
são os programas de televisão classificados como “reality shows”, nos quais um
grupo de jurados, composto por nomes consagrados em determinada área (chefs de
cozinha, cantores, designers de moda etc), avalia as performances de um grupo
de amadores cujo sonho é justamente se destacar naquela atividade à qual se dedicam
como passatempo. Quem não sonharia em ser um cozinheiro aplaudido, um cantor
famoso, uma designer de moda aclamada?
Até aí, tudo muito bem. O que
não entendo é a razão pela qual a fórmula desses programas tenha de se
sustentar no ato de os jurados humilharem sem dó nem piedade os esforços dos
participantes. Onde está a graça nisso? “Esse seu prato está um lixo
fedorento”, berra o renomado chef para o aprendiz, filmado ali com cara de
tacho. “Você canta igual a um porco na hora do abate”, diz a cantora famosa
para o rapazinho trêmulo agarrado ao microfone. Divertido, não é mesmo? Sim,
provavelmente, muito engraçado, haja vista a audiência. “O tempora, o mores”
(“ó tempos, ó costumes”), diria um observador de nossa era, no futuro,
resgatando a sapiência contida na língua morta de outro povo que iniciou sua
decadência a partir dos hábitos do cotidiano.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 18 de março de 2015)
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