Os natais de minha infância,
agora olhando em retrospecto, eram ecologicamente incorretos, uma vez que
passava-se o machado em pinheiros de verdade para que fossem transportados até
as salas das casas onde, imponentes e majestosos, plantavam-se perto da lareira
à espera dos adornos que os transformariam em árvores de Natal. Muitas vezes o
pinheiro foi retirado do pátio de casa mesmo, onde dois exemplares da espécie
viviam o ano todo mais ou menos alheios à nossa indiferença. Outras vezes meu
pai adquiria o pinheirinho na chácara de um cidadão que os comercializava nessa
época do ano.
Questões ambientais à parte, o
fato é que agora, quando chega dezembro, minha memória afetiva evoca do fundo
do baú de minhas lembranças o perfume característico de árvore que invadia a
casa toda quando o pinheiro era arrastado porta adentro, credenciando-se como
membro da família ao longo dos dias que antecediam e sucediam a data natalina.
Seu tronco era afixado em uma caixa de lata municiada de pregos internos,
dentro da qual colocávamos tijolos para sustentar o equilíbrio da estrutura.
Enchíamos de água o latão e minha mãe jogava lá dentro algumas pastilhas de
aspirina, a fim de manter o vigor da árvore por mais tempo. Verdade ou mito,
certeza mesmo é de que pinheiro lá em casa jamais sofreu de dor de cabeça.
Depois vinha a melhor parte:
enfeitar a árvore com os arranjos e penduricalhos que a mãe mantinha o ano todo
guardados sabe-se lá onde, em esconderijo bem distante de nossos olhos
infantis. Assim, o encanto e a magia se renovavam a cada ano, com a família
exercitando unida o ritual de engalanamento do pinheiro. E lá surgiam as bolas
coloridas, as estrelas, os papais-noéis, as velas, cada enfeite ganhando seu
lugar entre galhos e espinhos, mesclando-se ao verde silvestre da árvore. A seu
pé, iam chegando as figuras do presépio, que eu tinha fissura em montar.
Voltando a olhar em retrospecto,
creio que residia ali, naquele rito, a essência do significado do Natal: uma
família enfeitando o pinheirinho para receber o Papai Noel e refletir sobre o
significado verdadeiro da data cristã. Ecologicamente incorreto, bem, que
fosse. Pode-se obter hoje o mesmo efeito psíquico com uma árvore sintética. O
segredo da coisa continua morando no mesmo lugar: o interior de cada um. Bom
Natal!
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 24 de dezembro de 2013)
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