Tenho ficado grilado com essas
notícias sobre os javalis haverem se tornado uma praga descontrolada pelo
interior do Estado. Por serem exóticos ao ecossistema e não terem predadores
naturais, eles viraram uma ameaça ao ambiente nativo, a ponto de o próprio
Ibama liberar o abate da bicharada que anda à solta e aos bandos pelas matas e
fazendas gaúchas. Que coisa isso!
Na minha imaginação semeada pelas
décadas de leituras, caçar javalis sempre foi uma atividade prosaica
relacionada ao preparo de lautos banquetes em uma certa aldeia localizada na
região da Normandia francesa, por volta de 50 antes de Cristo, a fim de
encerrar com foice de ouro mais uma aventura dos gauleses mais famosos das
histórias em quadrinhos. Asterix, Obelix, Ideiafix, Panoramix e Abracurcix não
precisavam mais do que os próprios punhos para penetrar na mata e saírem de lá
com alguns pares de javalis que refestelariam o jantar da tribo.
Só vim a conhecer o sabor da
carne dos javalis que meus heróis da ficção consumiam anos mais tarde, já
morando em Caxias do Sul, em meados da década de 1990. Foi por essa época que
alguns criadores passaram a introduzir o javali em suas fazendas, imaginando
estarem a abrir um novo filão de mercado. E de fato, instalou-se certa febre
pela carne de javali pelo Estado. Restaurantes que serviam a iguaria exótica
eram disputados e comíamos deliciosos javalis assados puros ou cozidos ao molho.
Mas depois aquela cisma foi
passando, sabe como é: nós, a gauchada, até que não somos de muita frescura
alimentar, a gente experimenta uns nacos de carne exótica e comemos, vá lá, um
pedaço de javali, um veado campeiro, uma capivara, um coelho, essas coisas.
Mesmo nas churrascarias, beliscamos o salsichão, o franguinho, tá, vai. Mas
carne, índio veio, carne assim carne, mesmo, para lambuzar os bigodes e
arrebentar a guaiaca, para nós, é e sempre será a de boi.
E foi assim que o javali foi
saindo de fininho do cardápio, até se transformar nesse bandoleiro indômito que
toca o terror pelo Estado. Diferentemente dos quadrinhos, na vida real não há
poção mágica de druida gaulês a gerar solução fácil para o problema.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 1 de outubro de 2014)
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