Existe um personagem humano cuja
essência ainda resta cercada de mistérios e incompreensões, especialmente
porque as artes, por alguma razão que desconheço, não se debruçaram
suficientemente sobre ele até o momento. Sabemos que é por meio das artes que conseguimos
estabelecer conexões com as mais diversas facetas da alma humana, conhecendo
aspectos essenciais relativos aos outros e a nós mesmos. As artes possuem essa
função subliminar e fundamental, que une a sensação do prazer estético, na
primeira leitura que oferece, ao processo de apreensão de conhecimento, que se
dá de forma nem sempre racional. As artes são vitais para o desenrolar do
processo civilizatório e para a permanente transformação dos seres humanos em
mais humanos.
Daí que os filmes, as peças
teatrais, a literatura, as esculturas, os espetáculos de dança, a mímica, a
fotografia, a pintura e as demais manifestações artísticas, quando lançam suas
luzes sobre determinada faceta do imensurável espectro humano, aproximam-nos da
compreensão daquilo que, por experiência própria, jamais vivenciaríamos.
Compreendemos as angústias do palhaço de circo porque já vimos filmes e lemos
livros que abordam como personagens os palhaços de circo. Conhecemos a profundidade
do sentimento de obsessão levado ao extremo porque navegamos pelas páginas da
obra “Moby Dick”, de Herman Melville, acompanhando a caçada insana que o Capitão
Ahab empreende pelos vastos mares em busca da baleia branca, motivo do ódio que
lhe consome a alma. Conhecemos o horror da guerra ao fruirmos as linhas e as
formas criadas pelo pintor Picasso em sua tela “Guernica”. E assim por diante.
Mas, às vezes, a Arte deixa
órfãs algumas nuances da aventura humana. Os goleiros, por exemplo. Quem sabe o
que lhes passa pela cabeça durante os intermináveis minutos em que ficam parados
frente ao gol, observando o jogo se desenrolar no meio do campo? Qual o tamanho
de suas angústias ao terem de defender sozinhos um pênalti (o cineasta alemão
Wim Wenders é um dos poucos que já se debruçou sobre o tema)? Seriam todos os
goleiros filósofos? Pouco sabemos. Mas vale a pena refletir um pouco sobre o assunto,
especialmente neste domingo, 26 de abril, Dia do Goleiro (e de rodadas de
campeonatos estaduais).
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 25 de abril de 2015)
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