Jandira é uma moça bonita,
jovem, ingênua e pobre que se despenca do Nordeste para São Paulo na intenção
de concretizar o sonho de virar atriz de novela e, assim, ser alguém na vida. Na
cidade, é acolhida na periferia na modesta casinha de Zé, um primo um pouco
mais velho, solteirão, ingênuo como ela, caladão, esquisito, que trabalha duro como
faxineiro e faz-tudo em um condomínio e, nas horas vagas, habilmente produz
artigos de palha trançada. Gentil, Zé deixa a moça ir ficando enquanto mantém
inalterada sua rotina e seu foco no serviço e nas tranças de palha.
Mas um dia, Zé passa mal. É
levado ao hospital e, lá, descobre-se que sofre do mesmo problema que matou
prematuramente tanto seu pai quanto sua mãe: tem coração fraco e os médicos lhe
dão somente mais seis meses de vida. Zé se conforma com o fato ao relatá-lo à
prima: “é a vontade de Deus, né, Jandira; foi como meu pai e minha mãe; é a
vontade de Deus”. Jandira, no entanto, não se conforma com o conformismo letal
de Zé e, dentro de suas limitadas possibilidades, decide que aqueles seis meses
deverão se transformar em seis décadas de vida para Zé. Ele tem algum sonho que
deseja ver realizado? Não, ele não tem, ele precisa apenas seguir cumprindo
seus deveres no serviço. Ele tem algum lugar que deseja conhecer, tipo a praia?
Não, ele não tem, e nunca foi à praia porque “nunca precisou”.
Mas Jandira não se dá por
vencida. Ela arrebanha a ajuda dos colegas do salão de beleza em que trabalha e
vai à luta. Nos sábados, a turma leva Zé ao zoológico, ao baile, faz
churrasquinho na laje, toma um vinho, assiste tevê na sala comendo pipoca,
essas coisas. Zé aprecia os esforços de Jandira e Jandira se apaixona pelo Zé.
Quando abre o coração aos amigos do salão, vira inicialmente alvo de chacota da
turma, por estar apaixonada “pelo lentinho”. Aí vem uma das melhores cenas de
“Alguém Qualquer” (Brasil, 2012), filme de Tristan Aronovich, estrelado pelo
próprio e por Amanda Maya. Apaixonada e amargurada pela forma (aparentemente)
indiferente com que Zé reage ao sentimento, Jandira chora no salão e rebate o
espanto e escárnio dos amigos dizendo que não tem culpa por se apaixonar pelo
Zé, esquisito, “lentinho”, caladão.
Ela não tem culpa, ela se
apaixonou por ele do jeito como ele é. E assume e tenta vivenciar o sentimento
da melhor forma que a vida lhe propicia. Uma das lições do filme está aí. Há
outras. Recomendo.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 30 de dezembro de 2015)
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