A vida pode ser descrita como
uma caminhada. Todos sabemos disso. Todos já vimos, ou ouvimos, ou lemos ou
mesmo pronunciamos essa metáfora mais do que batida: “a vida é como uma
caminhada”. Sim, porque, assim como qualquer trajeto que se imponha à nossa frente,
também a existência é repleta de pedras no meio do caminho (como nos avisa
insistentemente o poeta), curvas acentuadas, solavancos e buracos (vida de
brasileiro, então, é repleta de buracos no meio da pista, assim como estradas
brasileiras), encruzilhadas, barbeiros na contramão, súbitas porteiras
fechadas, pedágios (ah, como brasileiro paga pedágio na vida e nas
estradas...), poeira a ser engolida, animais na pista e assim por diante.
A metáfora ligando vida a
caminho, como vimos, tem lógica e razão de ser, tamanho o número de pontos de
convergência simbólica entre os dois elementos. Vida e jornada, vida e viagem,
vida e trajeto a ser cumprido, tudo isso vale e nos ajuda a compreender melhor
(ou atenuar o eventual peso) esse fenômeno inexplicável que se dá com todos os
que nascem e que vão acumulando milhas de rodagem no cenário da existência: o
ato de viver. Viver é dirigir-se pelas curvas desse caminho, optando pela
direção a seguir quando chegam as encruzilhadas, acelerando ou reduzindo o
passo, evitando ou sabendo entrar nos buracos, ultrapassando com segurança,
observando as regras, essas coisas. A vida é assim. As caminhadas, também.
Talvez seja por isso que tenho
tentado desenvolver uma técnica anti-estresse quando me ponho a dirigir meu
automóvel pelas ruas da cidade e pelas estradas do Estado, sempre apinhadas de
veículos, nem sempre em bom estado de conservação, às vezes em obras, quase
sempre frenéticas. Descobri que a ansiedade em relação ao trânsito é o pior
inimigo de quem está ao volante. Pior inimigo para sua paz de espírito, para
sua saúde física e emocional e para a segurança de si mesmo, dos seus e dos
outros. Minha técnica consiste em acreditar que qualquer pequeno contratempo se
dá com a intenção secreta de me conduzir com maior segurança ao meu destino
final.
Afinal, nunca sabemos o que
poderia ter acontecido caso tivéssemos optado pela outra via na encruzilhada lá
atrás. Poderia ter caído em um enorme buraco. Talvez o engarrafamento me tenha
livrado disso. A vida, assim como as caminhadas e os trajetos, precisa de
leveza. Mas com atenção ao volante.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 12 de dezembro de 2015)
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