Eu em casa lavo muita louça. Não
que seja o único a lavar a louça em casa, mas sou um dos que mais lavam.
Digamos que minha participação no ato de lavar a louça suja em casa se dê na
ordem de 70%, os restantes 30% (ando bem de conta) tocando para a senhora minha
esposa, já que somos os dois únicos habitantes da residência e responsáveis,
portanto, direta e logicamente (ando bom de lógica também) pela sujança da
louça. Sujou, lavou, não é assim? Aqui, não. Aqui é: sujamos, lavei.
O interessante dessa coisa de eu
lavar a louça é que lavo e não reclamo. Quando menos se espera, lá estou eu,
barriga grudada na pia, detergente numa mão e esponjinha na outra, lavando
colherinha atrás de colherinha, pires após pires, xícaras e panelas. Sem
pestanejar. Assobiando, até (mentira, apenas cedi à força da imagem, pois que
não assobio coisa alguma). E por que isso se dá assim? Ora, respondo eu, caro
leitor, estimada leitora, porque sou largamente elogiado nisso que faço. Recebo
elogios generosos e desbragados sempre que lavo a louça. E adoro receber
elogios. Quem não gosta? Para recebê-los, então, lavo a loucinha. E sou afagado
em meu ego, mexo a cabecinha, levanto a patinha e abano o rabinho, contente e
faceiro. Quem elogia? A senhora minha esposa, lógico, que, de trouxa, só tem a
de roupa suja (essa, ao menos toca para ela).
E por que razão elogia minha
lavada de louça a senhora esposa minha? Ora, porque, detentora de raciocínio
lógico e conhecedora das técnicas de reflexo condicionado aplicadas pelos
treinadores às bestas (aqui, no caso, o senhor esposo dela), ela sabe muito bem
o poder existente em um elogio e como, a partir dele, é possível obter o melhor
das pessoas. Elogiar é um dos mais poderosos instrumentos de persuasão e de
conquista de boa vontade à disposição dos seres humanos e poucos se dão por
conta disso. Encastelados no alto de sua soberba, os prepotentes abrem mão do
uso de uma moeda de barganha infalível quando se pretende obter das pessoas
aquilo que delas se deseja. Elogie e terás o mundo a seus pés.
Minha esposa sabe disso e eu
lavo a louça, ansioso por receber, ao final, o torrão de açúcar que me vem na
forma de um elogio. Também recolho a roupa seca do varal, cozinho, faço compras
no mercado. Sou um amor? Não, sou um asno bem treinado. Mas, feliz, isso sim. E
abanando o rabinho.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 22 de dezembro de 2015)
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