Nem a própria Adele acreditou no
que estava acontecendo. Quem assistiu ao vivo pela televisão, na segunda-feira
retrasada (dia 15), à cerimônia de entrega do Prêmio Grammy aos melhores da
música internacional, realizada nos Estados Unidos, presenciou o inacreditável
momento histórico: uma das maiores vozes da música pop atual desafinando para o
mundo inteiro. Adele cantava à capela, só ela e um pianista, e, lá pelas
tantas, foi-se o boi com a corda: desafinou e não teve como recuperar a
qualidade até o final da canção. Como pode?
Bom, aí é que está a coisa:
pode. Pode, sim. Escorregar na maionese quando menos se espera é algo que pode
acontecer a todos os mortais, inclusive com aqueles que parecem menos mortais
do que os outros, como astros do quilate de Adele. Isso porque somos humanos e cometer
erros faz parte da essência de nossa espécie. Porém, viver neles, repeti-los e
nada aprender com eles significa optar pela via contrária ao desenvolvimento e
ao crescimento pessoal. Uma erradinha básica de vez em quando até pode ser saudável
para promover a retomada de nossa própria condição humana, amenizar possíveis
soberbas, convidar à autorreflexão, reordenar caminhos, retomar o treino,
cultivar a benfazeja humildade. Mas é preciso, para tanto, saber lidar com as
derrapadas. Aí é que está o pulo do gato. Aí é que são elas. Uma desafinada
pode ser revertida na chance de reafinar aspectos internos de nós mesmos, que
talvez andassem sendo negligenciados.
Vejamos o exemplo de Adele. A
cantora desafinou no palco, ao vivo, e o que ela fez? Bom, primeiro, agiu como
todo e qualquer ser humano faria: botou abaixo o camarim com chutes e bater de
portas, claro. Afinal, o camarim precisava ser punido pela desafinada dela (e
quem nunca puniu os outros por suas próprias falhas, que jogue o primeiro microfone).
Depois, abrandou a frustração saindo da dieta e devorando um hambúrguer duplo,
batatas fritas e bebendo cerveja. Tudo embalado a muitas lágrimas.
Até aí, tudo normal. Rodou a
baiana e abrandou a frustração, como fazemos todos nós, crianças humanas. Só
que, depois, passou a tirar de letra: deu entrevistas, contou isso tudo, riu da
situação e prometeu a si mesma melhorar, porque todos estamos sujeitos a errar.
Somos humanos e imperfeitos, errar faz parte. O bonito da condição humana é
justamente aprender com os erros e buscar permanentemente essa perfeição que,
mesmo jamais alcançada, sinaliza o caminho perene da própria humanização.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 24 de fevereiro de 2016)
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