Quando, enfim, nossa voz se
erguerá? Quando sairemos unidos às ruas protestando contra a opressão a que nos
vemos submetidos sempre que tentamos exercer nosso inalienável direito de
expressão? Até quando, corretor automático de texto, abusarás de nossa
paciência? Por quanto tempo ainda esse teu poder nos oprimirá? Não vês? Não vês
que nenhum de nós ainda coaduna com tua deselegância e aceita a invasão que
fazes em nossas consciências? Ó tempos, ó costumes! Que saudades da borracha e
do “liquid paper”!
Experimente, ó renomado leitor,
excelsa leitora, escrever a abertura desta crônica em algum aparelho (telefone
celular, tablet etc) que esteja impositivamente municiado com algum programa de
correção automática de texto. O que lerás? Certamente produzirás alguma
aberração textual como “Quasímodo, enfante, nossa vosmecê se erguida? Quasímodo
saia justa união às suas potesdades contra a ópera a que nos vencemos
submarinos sempre queda tentação excelência nosso intragável dirias de
expulsão?”. Sim, segundo a lógica de raciocínio do corretor automático de texto
que habitam alguns aparelhos meus, a insana frase acima, que deveria reproduzir
a segunda sentença do primeiro parágrafo, é plenamente viável.
Precisamos, urgentemente, que
algum programador de softwares crie programas que saibam corrigir as sandices e
sacanagens dos ditos corretores de texto. Adulteradores de texto e de intenções
eles são, isso, sim. Preciso, já, de um policiador de corretor de texto! Porque
vou escrever a um amigo “bom dia” e o troço já sai tascando “bondade sua”. Quero
demonstrar alegria pelo que alguém me escreveu teclando “heheheh” e, quando
vejo a tela, acabo de xingar o amigo chamando-o de “herege”. Imagino “já volto”
e anuncio “javali”. Teclo “espere um pouco” e envio “pareces morto”. Ando
perdendo amigos, gerando desconfianças e passando recibo de louco a torto e a
direito pela internet, devido aos desserviços prestados pelos corretores de
texto. Deformadores de texto, isso é o que são.
Borracha era o que se usava na
escola, ao copiar errado no caderno, a lápis, a lição que a professora ia
desenhando a giz no quadro-negro. “Liquid paper” era o produtinho que se
pincelava na lauda datilografada às pressas à máquina de escrever para sanar
erros de teclas acavaladas. Bons tempos. Hoje em dia, programinhas etéreos de
computador andam querendo antecipar até nossos pensamentos. Sorte nossa que
ainda pensam de forma incorrigivelmente burra.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 18 de fevereiro de 2016)
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