Dia desses, flagrei-me sem ovos.
Horrível isso, de ver-se desprovido de ovos. Abri a geladeira e a crua
realidade se descortinava ali dentro: nem um ovinho sequer, nem mesmo um
pequeninho de codorna, para salvar a pátria.
Esse tipo de situação é
impensável na vida de um homem que se preze: estar sem ovos. Impede que você
salve o jantar logo mais à noite, quando a esposa chega do trabalho, produzindo
uma omelete (que ela devora faceira, chamando de fortaia), ou surpreendendo-a
com panquecas recheadas de delícias, ou ainda, se a inspiração for do tamanho
da fome, com um elegante crepe (mas quando você está sem ovos, até mesmo um
singelo ovinho frito figura como a salvação da lavoura).
Isso não podia continuar assim, de
forma alguma. Onde já se viu, ficar sem ovos! Suspendi a produção do trabalho
que estava em curso, peguei o carro e fui até o mercadinho ali perto de casa,
onde o casal de proprietários me conhece e a simpatia está na alma do negócio,
motivo principal que os faz terem a mim como cliente, especialmente nesses
momentos cruciais que exigem solução rápida. “Boa tarde, Seu Fulano, tem
ovos?”, já entrei, perguntando. Diferentemente de mim, o dono do mercado tinha,
sim, ovos, o que revelou-se um verdadeiro alento.
Fui lá no canto que ele me
indicou com o dedo e pus-me a escolher belos ovos brancos de galinha, colocando
cuidadosamente um por um no saquinho plástico, pois que ali os ovos são
vendidos a granel e você pode comprar até números ímpares de ovos, ao invés das
restritivas caixinhas de sempre, com seis ou 12. Eu queria cinco ovos, e fui
pondo ali no saquinho, um ovo, dois ovos, três ovos, quatro pletch! O quarto
ovo sei lá o que deu nele, mas aproveitou um segundo de distração minha e
saltou do gancho de meus dedos com o qual eu o sustentava, rodopiando no ar e
indo se estatelar contra seus demais irmãos que tranquilamente se acomodavam no
fundo do saquinho.
Quebrei a ovaiada toda e fiquei
ali, com cara de tacho vazio. Felizmente, o dono do mercadinho, revelando-se um
expert em ovos e em fidelizar clientes, saiu de trás do balcão sorrindo, disse
que aquilo não era nada, pegou para mim outros cinco ovos e acomodou-os
intactos em outro saquinho, sem nem querer saber de me cobrar pela omelete
instantânea que eu me pusera a fazer ali na sua venda. De noite, vocês tinham
de ver o dó que me dava de quebrá-los para a fortaia...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 27 de setembro de 2013)
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