Com um movimento firme das mãos,
o homem transmite pela rédea a ordem que faz o cavalo parar o trote no alto da
campina. O encontro com o sol nascente parece cronometrado. Os raios de luz e
calor vão acordando a relva ainda gélida do orvalho da madrugada, descortinando
aos olhos do homem, de palheiro aceso sob o bigode, o cenário que ele está
habituado a presenciar, mas de cuja beleza rústica jamais se cansa.
Os joões-de-barro reiniciam o
moldar de casas sólidas no alto das paineiras; o gado reunido retoma o manso pastar;
o cachorro ovelheiro aguarda ao lado a ordem para campear o terneiro que desgarrou
mato adentro. Mais um dia nasce no campo dos cimos da Serra, igual ao que está
a surgir no dos pampas, no da região missioneira, no das fronteiras e
interiores do vasto Rio Grande, a unir gaúchos em seu modo peculiar de ser e de
sentir o pedaço de mundo que lhes foi destinado. Com um movimento dos
calcanhares, as esporas transmitem ao cavalo a ordem de retornar para casa, onde
o homem vai sorver os primeiros goles do chimarrão cuja água já chia na
chaleira de ferro sobre o fogão a lenha, cevado pela esposa que também madruga
e lhe está à espera.
Na mesma hora, na cidade grande,
arrancado da cama pelo rádio que lhe informa a temperatura e as notícias, o
homem escova os dentes e corre para o trabalho enfrentando o entrevero do trânsito.
Pelo caminho, os primeiros raios do sol da manhã vão lançando luz e calor sobre
o cimento dos edifícios que, ao longo dos anos, sopram para o limbo a madeira
das casas antigas que evocavam recuerdos.
Ele não vê a hora de chegar ao
escritório ou à repartição e sorver os primeiros goles do chimarrão que algum
colega madrugador já cevou para aquecer o início do dia. Sua esposa, do outro
lado da cidade, recebe também a primeira cuia preparada pela colega de trabalho
e sorve o mate pensando no marido e na felicidade de esperarem pela chegada do
final de semana, quando dançarão ao ritmo da chamarrita, do bugio, do chamamé,
no CTG da sua cidade.
Seja com o pé descalço pisando a
relva da campina ou com o sapato apertado aguardando o sinal no cruzamento,
gaúchos são gaúchos, e o ronco de uma cuia de chimarrão os torna a todos
universais. Agora com licença, que vou preparar um mate...
Nenhum comentário:
Postar um comentário