Gente, vocês hão de concordar
comigo: a vida é insólita! É ou não é, hein? Bah, mas, sinceramente, é, sim!
Não tem como dizer que não é. Porque é. Insólita. Imprevisível, sim, claro, a
gente nunca sabe o dia de amanhã. Sequer se estaremos aqui no dia de amanhã.
Imprevisível, tá bom, mas isso é o mínimo que a vida é. Estou falando de
insolitismo. Ou insolidez, também não sei como se usa o termo que deriva do
radical do substantivo “insólito”, porque agora faltou gramática aqui para o
escriba e quem mandou ficar secando fascinado a nuca macia e sedosa (eu
imaginava que fosse macia e sedosa, ao menos) da Sandra ao invés de prestar
atenção nas aulas de Português no Ensino Médio, ainda no tempo em que era
Segundo Grau?
Pois é, mas é insólita. Penso
nisso enquanto observo daqui da mesa de meu escritório, empenhado em redigir o
texto de um longo trabalho para um cliente, enquanto observo (a repetição é
necessária devido às longas intercalações que uso na construção desses textos
tergiversativos nos quais os leitores se sentem iguais a caçadores perdidos no
mato sem cachorro e pelos quais as senhorinhas aquelas do chá me execram e
ainda tencionam me passar um merecido corretivo). Fecha parêntesis e onde é que
eu estava mesmo? Ah, sim. No escritório, trabalhando e olhando para a porta de
entrada do apartamento em que moro. E pensando no insólito da vida. Qual a
ligação? Simples: uma colher de pau.
É, uma colher de pau. Tem uma
colher de pau cravada na fresta da porta do hall do apartamento. Isso é
insólito. Fui eu quem cravou a colher de pau ali, o que é mais insólito ainda.
E tenho motivos para isso, pois venta aqui em cima no prédio, o vento encana
pelas basculantes do corredor lá fora e vem bater na minha porta, promovendo
chacoalhões e um barulho irritante. Por isso, cravo-lhe a colher de pau, a
título de providência contra o chacoalhar da porta. Mas a cena é insólita.
A colher de pau da porta eu não
uso mais na cozinha. Aposentei-a de suas tarefas originais por razões óbvias
(nesse caso, insólito seria continuar usando a colher para mexer o feijão, logo
depois de usada na fresta da porta). Mas convenhamos... Insólito, não? Também,
que seria da vida sem o sabor do insólito? E não me olhem desse jeito...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 23 de fevereiro de 2015)
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