Como não sou sociólogo, e nem
antropólogo, muito menos psicólogo ou historiador, tenho muita dificuldade em
entender a razão dos temas sobre os quais reflito. Sendo assim, passo a vida
colecionando espantos e assombros, perplexidades e encantamentos a respeito dos
assuntos esses sobre os quais reflito, mas não consigo explicar, sequer
compreender. Meu olhar sobre o mundo é, então, de um eterno maravilhamento, esse
mesmo que os olhos de uma criança apresentam quando enxergam pela primeira vez
uma colher de sopa, por exemplo. Eu estou sempre com cara de quem está vendo
colheres de sopa pela primeira vez.
Digo isso porque estive a
refletir sobre qual seria o ímpeto que movia as pessoas de tempos passados (e
nem tão passados assim, apenas levemente amarrotados pelo distanciamento ainda
curto do presente) a empreender coleções de objetos os mais variados. Por que
fazíamos isso? Que espécie de carência psíquica supria aquele ato de acolherar
(as colheres, de novo, nesse texto) objetos similares obsessivamente e depois
atormentar parentes e visitas exibindo o fruto daquelas nossas obsessões? Que
gente estranha que éramos, naqueles tempos, devido a ações como aquelas.
Eu, por exemplo, colecionava
chaveiros. Tinha uma caixa de sapatos que, passados alguns anos, já quase
explodia de tanta chaverada que eu acolhe... digo, que eu guardava dentro dela.
Para quê? Colecionava também carrinhos de chumbo em outra caixa. Ah, e
revistinhas em quadrinhos. Minha irmã colecionava bonecas e selos. Um amigo
colecionava tampinhas de refrigerante, que vinham com imagens de personagens
infantis gravadas no lado interno. Um primo colecionava figurinhas. Um tio meu
colecionava flâmulas (aciono a máquina do tempo e traduzo: flâmulas eram
pequenas bandeiras de pano, triangulares, representando times de futebol e
agremiações diversas). Um colega de aula meio preguiçoso colecionava xingões
dos professores, mas agora acho que já estou exagerando em favor da construção
poética dessa crônica; paremos por aqui, antes que eu comece a colecionar liberdades
literárias.
Só sei que as coleções e o ato
de dedicar-se a elas foram minguando, minguando, e hoje são apenas parte do
cenário de um tempo e de uma gente que mora no passado. Por quê? Ah, se eu
fosse sociólogo...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 20 de fevereiro de 2015)
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