A senhorita Luba Luft, renomada
cantora lírica, visita uma exposição de quadros famosos em uma galeria de arte.
O que ela busca ali é sentir emoções, tentar vivenciar aquilo que o contato com
a estética das artes é capaz de proporcionar ao espírito. De repente, ela é
abordada por Rick Deckart, o caçador de recompensas. Luba Luft é o alvo de
Deckart. Se ele a caçar, obterá a recompensa.
Mas, antes de qualquer coisa, Deckart
acompanha Luba Luft em seu flanar pela galeria, e a observa namorar um livro
que contém reproduções das telas do pintor norueguês Edvar Munch (1863-1944), a
quem ela mais admira. Deckart decide comprar o livro e oferece-o de presente a
Luba, que fica impressionada com o gesto. Um gesto que somente seres humanos
são capazes de apresentar, uma vez que seres humanos sentem empatia pelas
demais criaturas. Até mesmo por ela, Luba Luft, uma androide, que está sendo perseguida
por Rick Deckart, o caçador de androides, conforme a narrativa do livro Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?,
escrito pelo norte-americano Philip K. Dick (1928-1982) e que inspirou o filme Blade Runner (1982).
A diferença, portanto, entre
seres humanos e androides, reside na capacidade humana de ter empatia, esse
sentimento que nos permite imaginar o que o outro está sentindo, de sofrermos e
de nos alegrarmos com o sofrimento e com as alegrias dos nossos semelhantes. Em
outras palavras, sabemos “nos colocar no lugar do outro”, capacidade que os
androides da ficção-científica na literatura e no cinema não possuem. Androides
não conseguem se colocar no lugar do outro e, portanto, agem de forma individualista,
egoísta, robótica e desumanizada.
Eis aí, na ficção-científica, a
chave para compreender o mundo real no qual estamos inseridos. Os androides
existem e já estão entre nós. Eles são os motoristas que se colocam no trânsito
como se estivessem sozinhos; são os corruptos que roubam o dinheiro público que
serviria para a saúde e a educação da população; são as pessoas que descumprem
as leis; as que furam as filas, as que abusam dos “jeitinhos”, as que só pensam
em si mesmas. São as que torturam e matam, são as que agridem, são as que fazem
bullying, são as que discriminam as diferenças, são as intolerantes, são as
sacanas. Estamos cada vez mais cercados por androides. Tomara que a ausência de
empatia não seja um mal contagioso. Precisamos urgentemente nos vacinar com
doses cavalares de humanidade.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 19 de agosto de 2015)
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