Às vezes dá vontade de fugir,
não dá? Sumir do mapa, largar tudo, não ser encontrado por ninguém, não ter de
monitorar o vencimento das contas, poder faltar ao trabalho, descumprir
compromissos, burlar horários, almoçar de noite e jantar pela manhã, deixar de
lado os deveres, ludibriar o relógio, arremessar longe o celular, ignorar o
noticiário, escapar do trânsito, enfurnar-se na caverna, ou na ilha deserta
sempre sonhada, ou na praia, ou no campo, enfim, acomodar-se em algum não-lugar
onde se possa não-ser por alguns dias, por algumas horas ao menos, ou mesmo por
um punhado de minutos, caso nada disso seja realmente viável, e, na verdade,
nunca o é. Mas que vontade que dá!
A literatura clássica nos fala
do termo latino “locus amoenus”, que em tradução livre do latim significa algo
como “lugar tranquilo”, representando um idílico local em meio à natureza a ser
buscado, no qual se poderia encontrar a paz da alma que os seres humanos tanto almejam
desde priscas eras. Também a tradição mitológica europeia vislumbra o chamado
“Fiddler’s Green”, uma espécie de paraíso pós-morte destinado aos bons
marinheiros, no qual seriam recompensados, pela árdua vida no mar, com a
eternidade em um local onde a alegria é permanente.
Nos meus tempos de guri em Ijuí,
lembro que meu pai adquiriu um pedaço de terra no interior da cidade, ao qual
batizou de “Refúgio Tranquilo”. Não sei se ele batizou a área pretendendo
evocar o “locus amoenus” da literatura clássica ou se foi apenas uma inconsciente
coincidência sincrônica. O que sei é que, na infância e adolescência, eu tinha
o meu próprio refúgio tranquilo instalado no pátio de casa, quando me sentava
sob os galhos de uma frondosa timbaúva para ler gibis e os livros de Monteiro
Lobato, naquelas longas tardes cujo silêncio só era quebrado pelo afinado coro
das cigarras.
O desejo de construirmos
paraísos factíveis ao alcance de nossas necessidades reais é uma necessidade
vital para a manutenção da sanidade psíquica nesse cotidiano moderno pautado
por atribulações, temores e ansiedades. Se não podemos fugir descabeladamente
para a praia deserta dos sonhos, podemos, ao menos, durante aqueles dois minutinhos
que sejam, dar uma escapadinha de volta para a sombra das timbaúvas de nossas
infâncias e restabelecer as energias em um refúgio tranquilo erigido na mente.
Eu tenho o meu. Qual é o seu?
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 7 de agosto de 2015)
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