Minha esposa para de repente no
corredor do shopping e larga a mão da minha, ato que me deixa por alguns
segundos andando e falando sozinho. Eu me viro e vejo-a ali, o olhar
aparvalhado, a boca semiaberta, os ombros caídos, naquela típica postura de
quem está surpreso a ponto de perder as forças. Ela me olha fixamente e
balbucia: “repete o que você acabou de falar”.
(Intervenção providencial para evitar mal-entedidos: não, leitores, não
se trata de ceninha de casal em público, muito pelo contrário, como já verão)
“Repete o que você acabou de
dizer”, insiste ela, modificando apenas o verbo final da frase. Eu puxo da
memória o fio da meada e profiro de novo, claro que não literalmente, aquilo
que acabara de dizer, que fora algo como: “bah, amor, você não acha que está na
hora de trocar essa sua bolsa? Essa aí está bem velhinha, parece um saco. Tem
tantas bolsas bonitas circulando por aí, você merece uma melhorzinha, não acha?
Quem sabe aproveitamos que estamos aqui e compramos outra?”. Foi algo meio
assim.
Ela não podia acreditar que
tinha ouvido aquilo sair de minha boca. Logo eu, sempre no mundo da lua (das luas
de Júpiter, ressalte-se); logo eu, sempre desligado dessas coisas (e por “essas
coisas” entenda-se todas aquelas coisas sobre as quais nós homens somos
desligados e as mulheres sabem muito bem do que se tratam); logo eu, que sou capaz
de passar 16 anos usando a mesma calça a não ser que haja uma mulher ao meu
lado evitando diariamente que minha porção cro-magnon saia do armário e
prepondere. Logo eu, tendo um ataque súbito de sensibilidade, percebendo que
ela deveria trocar de bolsa! Por um momento ela temeu ter se enganado e trocado
de marido.
Mas não, era eu mesmo, o que ela
certificou apalpando meu ombro e meus bolsos, nos quais obviamente não havia
dinheiro para concretizar a troca da tal bolsa, mas, arrá, havia o cartão de
crédito! Aproveitei a perplexidade dela e puxei-a para dentro da loja de bolsas
mais próxima. Só que era “aquela” loja, meu caro, “aquela”, sabe? Quem manda
ser bem-intencionado mas desinformado (para não dizer burro mesmo) quanto ao
preço “daquelas” bolsas? Saímos dali de mãos e bolsa velha abanando. Mas, a
julgar pelo ar pensativo dela na volta para casa, com um meio-sorriso no rosto,
acho que ganhei o dia como se tivesse mandado flores...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 5 de agosto de 2013)
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