Abri o site da versão eletrônica
daquele jornal que sempre leio e estava ali a chamada, ao pé da tela: “Cozinhe
para seus inimigos”. Uma fotinho exibindo um prato fumegante com algum repasto certamente
delicioso ilustrava o link, que dava acesso a uma das páginas de gastronomia
que costumo visitar em busca de receitas que depois tento reproduzir em casa
para a esposa, algumas vezes com relativo sucesso.
“Cozinhe para seus inimigos”...
Tirei o olhar da tela e fiquei fitando o vazio, o queixo erguido, o olhar
passeando pelos cantos do teto, de onde uma teia de aranha balouçava
desdenhosamente, colocando em xeque minhas habilidades de faxineiro, uma vez
que ontem mesmo eu metera a vassoura por ali e até então tudo ia bem, mas
depois eu vejo isso. Mantive em suspenso minha intenção de clicar logo no link
e conferir a matéria gastronômica brotada da surpreendente mente do jornalista
que bolara aquela pauta inusitada, sugerindo convidar os inimigos para um
banquete em sua casa, preparado por você, num gesto de papal e franciscana
boa-vontade como jamais se ousara imaginar antes da mais recente visita do sumo
pontífice ao nosso país.
“Pois sim”, fiquei matutando...
“Cozinhar para meus inimigos”... A proposta soava como uma admoestação bíblica
e imaginei Jesus Cristo convidando Pôncio Pilatos, Judas, Caifás, Satanás e
outros vilões para cearem com ele um jantar fraterno regado a pão e vinho. Depois
criei na mente a imagem de Barak Obama recebendo nos salões ovais da Casa
Branca Saddam Hussein, Osama Bin Laden, Muamar Kadafi, o Aiatolá Khomeini e
Fidel Castro para juntos destroçarem amigavelmente um peru de Dia de Ação de
Graças, conclamando à paz mundial.
De minha parte, tive dificuldade
em inventar inimigos para comigo apreciarem algo advindo de minhas panelas, e
priorizei o enfoque de meus devaneios em direção ao cardápio que eu organizaria
para a especial ocasião. Será que meus supostos inimigos apreciariam trufas
gratinadas ao mel? Ou um gaspacho com mix de folhas verdes? Um suflê de cenouras?
Um modesto ratatouille?
Súbito, saí do devaneio e pousei
de novo o olhar sobre a chamada na tela, disposto a ler a matéria: “Cozinhe
para seus amigos”. Epa! “Amigos”, não “inimigos”! Meus olhos haviam lido errado
e a chamada, na verdade, era prá lá de trivial. E eu aqui, já cozinhando
crônicas...
Nenhum comentário:
Postar um comentário