Apesar de ter encantado crianças
de várias partes do mundo ao longo das últimas décadas, o personagem televisivo
“Chaves” não tinha em mim um integrante de suas fileiras de fãs. Creio que esse
descompasso se explica pelo fato de que, quando os episódios começaram a ser
transmitidos por canais brasileiros de televisão, especialmente o SBT, em 1984,
eu já era bem grandinho e estava preocupado com o início de minha vida de
estudante universitário. Não criei, portanto, empatia com o universo de Quico,
Chaves, Seu Madruga, Chapolin Colorado, Chiquinha, Dona Florinda e outros.
Mesmo assim, tocou-me a morte do
ator mexicano Roberto Bollaños, aos 85 anos de idade, ocorrida em 28 de
novembro, justamente por ser ele um ícone da cultura pop e tão significativo
para a história pessoal de tanta gente que conheço. Nunca assisti a um episódio
inteiro de Chaves, mas o poder de irradiação dos jargões dos personagens
ultrapassava barreiras e não foram poucas as vezes que inseri em minhas falas
as famosas “suspeitei desde o princípio” e “não contavam com a minha astúcia”.
Dessa forma, sempre atento ao que se passa por aí, não pude deixar de parar
para refletir sobre algo que li ainda ontem, relativo ao caso da morte de
Bollaños.
Carlos Villagrán, o ator que
interpretava o bochechudo e esbugalhado Quico, está a se lamentar publicamente
pelo fato de não ter conseguido se reconciliar com Bollaños antes da morte dele.
Os dois atores se desentenderam ainda no início dos anos 1980, o que ocasionou
a saída de Villagrán do seriado. Voltaram a se falar uma que outra vez, décadas
depois, mas a reconciliação mesmo jamais aconteceu. E agora, Villagrán chora
sobre o leite derramado que ninguém se preocupou em tentar colocar de volta na
leiteira. Tarde demais.
Tocante o compartilhamento que
Villagrán faz em público de seu arrependimento. Especialmente por servir de
alerta a cada um de nós, junto a um convite para refletirmos sobre o que
estamos deixando passar em termos de questões mal resolvidas. O tempo é
inclemente e não faz paradas para a reflexão. Temos de refletir e agir com o
bonde em movimento. Mais tarde será tarde.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 5 de dezembro de 2014)
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