O convite estava agendado há
mais de mês e não havia a menor possibilidade de ser negligenciado. Chovesse
canivetes, morresse o papa, revolução eclodisse, a cobra fumasse, corruptos se
arrependessem, o sol congelasse, o sertão virasse mar ou o mar virasse sertão,
só havia uma única alternativa: comparecer. Assim, comparecemos, minha esposa e
eu, à apresentação de final de ano organizada pela escolinha maternal que nosso
afilhado de dois anos e meio frequenta, no domingo que passou. Afinal, não
basta ser dindo, tem de participar.
Meu afilhado foi fantasiado de
leão, uma vez que esse é um personagem que ele encarna com perfeição no
dia-a-dia, especialmente quando me vê e se põe a rugir exibindo a fileira de
dentinhos de leite e franze o nariz como se fosse o focinho de um felino bravo
e faminto. As mãozinhas em garras completam a performance, valorizada com o meu
susto e minhas fugas tresloucadas.
Assistimos, então, à apresentação
preparada pelas profes, reunindo a gurizada dos maternais, dos berçários e do
jardim no palco, entre leões, homens-aranha, homens-de-ferro, princesas,
brancas-de-neve, batmans e outros personagens, uns cantando direitinho a música
ensaiada, outros batendo palmas, alguns olhando para trás, vários deles
abanando para papais, mamães, dindos e titios na plateia, um que outro
estaqueado feito estátua frente a tantos adultos sorridentes olhando para eles,
tudo devidamente registrado em aparelhos celulares, máquinas fotográficas e
tablets, para a posteridade.
Encerrada a parte oficial,
partimos para o que realmente interessava: as crianças rumo aos brinquedos
instalados no ginásio e os adultos rumo ao setor dos comes e bebes, onde o
cachorro-quente e o algodão-doce estavam divinos. Difícil foi resistir ao
convite insistente do afilhado, que queria me puxar para dentro de um
cercadinho em que mal cabiam ele e um amiguinho, pulando alegremente sobre uma cama
elástica. “Didu, enta!”, foi o convite. Óbvio que eu não cabia ali dentro,
apesar da vontade. Mas valeu o presente de ter sido visto pela dupla como um
igual, cuja companhia no brinquedo lhes seria bem-vinda. Foi uma honra.
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