Muito mais do que o futebol,
caixinha de surpresas mesmo é a vida. “Vou morrer velho e não vou ver tudo” e
“não há o que não haja” são expressões populares que resumem bem o sentimento
de espanto que o fato de se estar vivo nos acomete com mais frequência do que
somos capazes de admitir. Eu, que desembarquei nesse mundo há pouco menos de 50
anos, já acumulo centenas de episódios que me chegaram ao conhecimento (e/ou
que presenciei) que são dignos de espanto. O interessante na coisa toda é que
espanto é uma sensação que não se esgota jamais: sempre somos capazes de sermos
surpreendidos pelo inesperado, por mais coisas que já tenham visto, vivido e
sentido as nossas cãs.
Agora, por exemplo, Cuba e
Estados Unidos organizando o restabelecimento de relações diplomáticas e
comerciais, dando fim a um afastamento e a um embargo que duravam quase seis
décadas. É a pedra derradeira que faltava para que se enterrasse
definitivamente a Guerra Fria, cujo processo de caducança teve início ainda em
1989, com a queda do Muro de Berlim, seguida pelo efeito dominó da derrocada
dos regimes comunistas do Leste Europeu. Quem diria que iríamos viver para
presenciar isso...
Décadas atrás houve a libertação
de Nelson Mandela, na África do Sul, antecipando o fim do apartheid, sistema segregacionista
que oprimiu aquele país por décadas. Quem diria? Um papa renunciar e se retirar
para a aposentadoria, como fez há pouco o Bento XVI... Quem diria? Mulheres
conquistando o cargo de presidente em vários países do mundo; o fumo sendo
banido dos espaços públicos; o álcool antes de dirigir sendo combatido; Bob
Dylan gravando canções de Frank Sinatra; Plutão perdendo o status de planeta e
depois sendo reabilitado; casamento homossexual sendo finalmente oficializado
nos setores mais civilizados do planeta... Quem diria?
É por essas e outras que sigo
tendo convicção de que ainda é válido lutar pelos sonhos e arregaçar as mangas
para tentar mudar o que precisa ser mudado ao nosso redor. Sempre há muito por
fazer, é verdade. Mas, felizmente, a vida e o mundo são elementos possíveis de
serem transformados. A História que o diga.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 19 de dezembro de 2014)
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