Eis que então, no final de
semana, chegou o inverno. Lá em casa, no entanto, ele já havia aparecido alguns
dias antes da data oficial em que todos o esperavam. Não sei se minha esposa
deu cópia da chave para ele ou se entrou sorrateiro pela porta entreaberta na
tarde em que a faxineira veio fazer a limpeza do apartamento, já nas despedidas
do outono. O fato é que, quando nos demos por conta, ele estava instalado, sem
aviso ou cerimônias, como se fosse da casa, e foi ficando.
Quando uma visita inesperada
chega assim, de supetão, é preciso você se adaptar a ela, para não ser
indelicado. Com o passar do tempo, aprendi que não vale a pena assumir uma
postura belicosa ou mesmo de amargor e confronto para com as facetas do clima,
apareça ele em sua casa travestido de inverno, de verão, de primavera ou outono,
e o melhor mesmo é aceitá-lo na forma como ele vem e encontrar meios de fazer
com que a estada – normalmente longa, de três meses ao ano – seja o mais
harmoniosa possível. Dos quatro visitantes sazonais, o mais difícil de lidar é
justamente o inverno, que nos exige doses maiores de paciência, compreensão e adaptabilidade.
Já estamos até meio que acostumados.
Só que dessa vez ele chegou em
hora imprópria, ao antecipar em alguns dias inesperados a sua aparição lá por
casa. Os cobertores tiveram de ser desencaixotados às pressas, as luvas e os
chinelos de pano idem, as estufas para aquecer o banheiro na hora do banho foram
resgatadas e a lareira da sala foi arrancada de sua hibernação e meio que teve
de pegar no tranco. A cafeteira passou a trabalhar em turno dobrado e aquele
vinho que há tempos rolava intocado levou um susto ao ser transformado de
súbito em panela de quentão, pois que minha esposa fez aparecer, por mágica,
acredito, alguns cravinhos-da-índia de dentro da despensa.
Como ele chegou este ano alguns
dias mais cedo, já estou em negociações para que, a título de contrapartida,
encurte sua estada e deixe lugar para a vinda da primavera alguns dias antes do
oficial 23 de setembro. Primavera já enviou e-mail dizendo que topa. Quanto ao
inverno, vamos ver, mas está meio difícil de quebrar o gelo e arrancar
promessas de sua postura glacial...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 22 de junho de 2015)
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