Andei lendo por cima nos jornais
a notícia (a notícia não, a informação), a informação, então, de que um novo
filme do Godzilla está estreando nos cinemas do planeta. O Godzilla, para quem
nasceu ontem e eventualmente não saiba, é um lagartão gigantesco que solta
raios pela boca. Ele emerge do mar, furioso, sem avisar ninguém, e se bota a
destruir grandes cidades, especialmente no Japão, país em que foi originalmente
criado para povoar em seriados televisivos as tardes de crianças do mundo todo
em décadas passadas (eu fui uma delas, apavorado com o monstrengo em frente à
televisão preto e branco e a válvula, marca Telefunken, naquelas tardes longas
da infância na Rua dos Viajantes, em Ijuí).
Permanecem vívidas em minha
memória telúrica as patadas certeiras que Godzilla (um ator enfiado dentro de
uma fantasia tosca de borracha), incontrolável e ensandecido, desferia contra
maquetes de prédios feitas em papelão nos estúdios televisivos. As imagens de
destruição eram intercaladas com closes de multidões de pessoas apavoradas
gritando e fugindo, cada um para um lado, o que intensificava a sensação de
perigo que chegava a tirar o meu sono mais tarde quando, às nove da noite, meus
pais me colocavam na cama. Nove da noite era hora de criança ir para a cama,
naqueles tempos em que Godzilla arrepiava na televisão sem cores.
Pois agora informam que Godzilla
está de volta, em nova versão cinematográfica produzida com os mais modernos
efeitos especiais de Hollywood. Ah, pobre cidade que vier a ser devastada por
esse Godzilla altamente tecnológico. Não vi o filme do Godzilla, tampouco verei
o novo filme do Godzilla. Afinal, meu sono tem andando tão bem ultimamente que
não quero correr o risco de despertar a criança impressionável que talvez ainda
resida em algum lugar aqui dentro.
Mas confesso que fiquei curioso
com a revelação, na matéria, de que a nova trama de Godzilla traz menos ação e
mais drama. Sim, dizem que conseguiram enfiar um enredo com drama familiar e
emocional no filme do Godzilla, não sei a troco de quê, uma vez que, o Godzilla
que eu conheço, só se interessa por dar caudadas em arranha-céus. Vai ver que,
para manter seu Ibope em alta, Godzilla precisa agora apelar a outros truques
para enfrentar a concorrência no quesito destruição de cidades, o que vem sendo
feito com bastante competência pelos humanos mesmo, que viraram experts em
transformar seus habitats naturais (as cidades) em infernos decadentes. Quem,
dos habitantes atuais do caos urbano diário, vai ter medo do lagartão?
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 17 de maio de 2014)
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