Vou contar uma história sobre
mim mesmo. Mas, depois, vou usar esse exemplo pessoal como um gancho para
propor uma reflexão de âmbito geral, que encontre eco no íntimo dos leitores,
alcançando assim um cunho universal e conferindo ao texto o tom de crônica, e
não de mero diário íntimo. Pronto, acabo de entregar o jogo todo e revelar o
processo básico de fazer crônica. Agora, com a farinha e o fermento na mão, só
falta meter a massa no forno e de lá retirar os pães ou as pizzas você mesmo.
Não precisa mais depender do cronista aqui. Dei um tiro no pé, mas agora já
está feito. Adiante.
A história sobre mim mesmo nos
conduz à cidade de Santa Maria, no início dos anos 1990, quando eu dava meus
primeiros passos no mundo do jornalista profissional. Carteira assinada e a
promessa de salário pingando na conta todo o mês, dei um peitaço e aluguei uma
casa para morar, abandonando a república de estudantes. A casa tinha um quintal
e eu, inebriado em sonhos juvenis, já me imaginava ali nos fundos, aos finais
de semana, cultivando uma hortinha na qual plantaria alface, tomate, chuchu,
cebola, cenoura, a título de adoção de um passatempo saudável e sadio.
Mas tudo não passou de sonho e o
projeto morreu na casca, pelo simples fato de que eu sabia que jamais me
dedicaria de verdade ao cultivo da horta no quintal. Eu não sou dado a essas
lides, não faz parte de minha essência, apesar de muito admirar quem o faça.
Cada macaco no seu galho, sabe como é. Uma vez que desejava ser jornalista e
escritor, passei a vida cultivando o quintal da leitura (para obter informação
e substrato) e da escrita (para treinar a técnica e moldar o talento). Isso
porque eu sempre soube que, para florescer e vingar, quintais e hortas precisam
ser cultivados, sejam eles quais forem.
Foi mais ou menos isso o que o
escritor José Clemente Pozenato quis dizer ao declarar ao Pioneiro, na edição
de segunda passada, que “precisamos cultivar a nossa horta”, ao endossar a
importância da iniciativa da Academia Caxiense de Letras, de reunir escritores
locais para compor as rodadas de debates da 8ª Semana do Escritor, incluída na
programação da Feira do Livro deste ano. Sementes importantes estão sendo
plantadas na horta da literatura local há décadas e é preciso cultivá-las. O convite
está feito: dê uma passadinha na Feira e ajude a regar a horta.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 7 de outubro de 2015)
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