Não
dá mais para ficar tentando tapar o sol com o coador. As notícias escancaram
isso todos os dias de norte a sul no país e cada um percebe a situação em seu
próprio entorno, obrigando-se a alterar hábitos e comportamentos. Agora, chegam
os resultados dos estudos para demonstrar claramente o tamanho e o formato do
monstro: somos, nós, brasileiros, uma das sociedades mais violentas do mundo.
O
caldo entornou e não adianta insistir no discurso cor-de-rosa para inglês ver,
de que tudo não passa de forçação de barra da mídia. Os números falam por si,
especialmente os divulgados este mês pela ONU, inseridos no Relatório Global Sobre
Homicídios, demonstrando o quadro da violência no planeta no ano de 2012. O
Brasil ocupa uma desconfortável posição de destaque entre as nações mais
violentas da Terra, respondendo por 11% dos homicídios (50 mil casos) registrados
no planeta naquele ano (total de 437 mil), integrando o segundo grupo dos mais
violentos (25 homicídios para cada 100 mil habitantes), na companhia de México,
Nigéria e Congo.
O
primeiro grupo (30 homicídios a cada 100 mil habitantes) é constituído por
nações como Colômbia, Venezuela, Guatemala e África do Sul. Mas estamos
demonstrando possuir uma vocação irrefreável para rapidamente migrarmos para o
primeiro grupo, do jeito como seguem as coisas. Os dois fatores apontados pelo
levantamento como sendo as principais causas da violência assassina no nosso
país são o abuso de álcool e outras drogas e o acesso fácil às armas de fogo.
Ou seja, mata-se aqui porque é fácil matar, uma vez que o casamento entre os
dois fatores (armas e psiquê alterada) é socialmente facilitado. Isso, claro,
sem falar na impunidade, na derrota do Estado frente ao crime organizado, na
falência das prisões etc.
Mas
o que o estudo da ONU não mostra é o processo galopante de inserção da
violência no cotidiano do cidadão comum, que se transforma também em protagonista
de pequenas violências comportamentais, essas que verificamos no trânsito, nas
filas, nas calçadas, no teor dos e-mails e das manifestações em redes sociais,
nas pequenas e grandes corrupções, no lixo jogado nas ruas e assim por diante.
A violência, travestida de preocupante normalidade, está se tornando parte
integrante da cultura nacional, junto com o samba, a caipirinha, o chimarrão, a
Bossa Nova, o Carnaval, o futebol... Seguimos morando em um país tropical,
bonito por natureza, sim. Mas olhem bem: tem cupim danado roendo a moldura do
quadrinho.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 15 de abril de 2014)
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