Ontem
compartilhei aqui um episódio bizarro acontecido anos atrás, envolvendo minha
avó paterna, que engoliu a aliança de pedido de casamento em uma romântica taça
de espumante preparada cuidadosamente por meu avô, em um jantar. Narrei o fato
com a intenção de, nas entrelinhas, demonstrar que, apesar do incidente, o pedido
foi aceito, eles casaram, tiveram filhos, netos e bisnetos, construindo uma
longa vida a dois que se consolidou apesar do engasgo inicial.
O
ponto para a reflexão da croniqueta consistia na percepção de que, com
determinação, amor e vontade, qualquer entrave pode ser removido em favor do
objetivo principal que desejamos alcançar na vida. Bonitinho, não? Afinal, uma
crônica que se preze precisa pelo menos tentar proporcionar ao leitor um ponto
para a reflexão, mesmo sendo moldada no tom de uma história aparentemente
superficial e engraçada.
Foi
por isso que invoquei a história de minha avó e suponho que tenha obtido a
bênção dela de lá onde quer que ela esteja, certamente junto com meu avô, já
que alianças de casamento engolidas dentro de taças de espumante devem deter um
poder de união que ultrapassa o desaparecimento físico do casal de envolvidos,
creio eu. Mas houve leitores que me escreveram insistindo para que eu narrasse
outros episódios de minha avó engolidora de bizarrices. Cedo, então, ao apelo e
libero mais um, torcendo para que ela não me venha puxar os pés de madrugada.
Já
casada, de aliança devidamente estacionada no dedo, lugar que desde o início
lhe era destinado pelo costume e o bom senso, minha avó teve de ir ao dentista
fazer um tratamento de canal. Tratamento de canal, todos sabem, exige que se
fique longos períodos com a boca aberta, aquelas agulhinhas cravadas em torno
do dente, praticando a arte de engolir saliva de tempos em tempos sem fechar a
boca. Numa dessas, glump, minha avó engoliu uma das agulhinhas, que estava
frouxa em sua boca.
Ela
sentiu a coisinha descendo pela garganta e fez um sinal ao dentista que, a
princípio, não acreditava no que havia ocorrido, mas se convenceu dias depois,
com a revelação das radiografias do estômago de minha avó, a engolidora. Diz
ela ter passado cinco dias comendo bolas de algodão, que serviram para envolver
o objeto pontiagudo e convencê-lo a sair da mesma forma como ela recuperara a
aliança, anos antes.
Brincando,
meu avô dizia tremer de medo sempre que um circo resolvia fazer temporada em
Ijuí. Vai que estivessem precisando de engolidora de espadas e ela fugisse com
o trapezista... Aqui também tem entrelinhas tá, leitores? Procurem.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 17 de abril de 2014)
Nenhum comentário:
Postar um comentário