Foi
no cair da tarde de sexta-feira, quando encerrei minha semana de trabalho e
decidi aproveitar o restinho de sol para dar uma caminhada pelo bairro,
seguindo o exemplo e as recomendações de meu cardiologista, que é um ser
caminhante. Caminha ele, caminho eu. Não fuma ele, não fumo eu. Não é bobo ele,
tampouco eu.
Pois
calcei o par de tênis e larguei-me pelas calçadas das cercanias, determinado a
empreender pelo menos aqueles 50 minutos de caminhada ininterrupta que, dizem,
é o suficiente para ativar não sei o que e proporcionar não lembro quais ganhos
à minha saúde. Não preciso saber de cor nada disso. Basta-me saber que é
saudável e me boto então a caminhar, desde que, óbvio, atente nas esquinas e
nos cruzamentos ao cruzar ensandecido dos veículos que, eles sim, são
deletérios à saúde de qualquer caminhante, caso se dê o infortúnio de colherem
algum deles no meio da rua, ocasião em que vai para a cucuia o fato de ser ou
não fumante, cuidar ou não da alimentação, beber moderada ou desregradamente,
seguir ou não as orientações do médico, frequentar a missa aos domingos, não
dizer palavrões, essas coisas todas.
Cuidando,
então, nas esquinas, para atravessar as ruas, fui-me, lépido e fagueiro,
caminhar pelas redondezas naquele final de tarde de sexta, conforme eu ia
dizendo ali no início da coluninha. Metia um tênis na frente do outro quando
minha atenção foi desviada para uma peixaria que abriu as portas recentemente
nas imediações. “Opa, peixe! Peixe é bom para a saúde e para aumentar meus
índices de não sei bem o quê”, raciocinei, decidindo que, na volta, faria um
pit stop ali e levaria para casa alguma coisa que serviria de janta saudável
para mim e para minha senhora, quando ela retornasse do trabalho.
Na
volta, fiz o previsto. Comprei umas postas de salmão e rumei para casa. No
caminho, de repente, fui atacado por um cachorrinho medíocre que farejou o
cheiro irresistível do peixe e raciocinou que, em acabando com a minha raça
ali, na calçada, garantiria ele próprio o jantar sem maiores incômodos.
Cravou-me os dentes no calcanhar, sem aviso, o irascível, proporcionando-me
minha primeira experiência de mordida de cachorro em 47 longos anos de vida.
Espantei-o
com minha voz de cachorro grande e protegi minha caça, garantindo o sucesso do
jantar, uma vez que, mais do que ao cusco, temia a possível reação da esposa ao
revelar meu fracasso frente à disputa animal que se dava em meio à calçada.
Hoje em dia não se pode mais confiar nem em singelos lulus. E que dificuldade
manter a forma. Acho que vou comprar uma esteira.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 28 de abril de 2014)
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