Pois é, mais de vinte anos
morando aqui na Serra Gaúcha, não podia dar outra: acabei me aculturando em
diversos aspectos. Absorvi hábitos, adotei costumes, ampliei o espectro de meus
interesses gastronômicos, alarguei horizontes, coisa e tal. Vindo que sou da
região noroeste do Estado, vizinho das Missões, até que passo por um gringo
perfeito se me observarem de longe, à mesa, por exemplo. Viciei em radicci, pissacán,
pien, codorna, sopa de agnoline e sopa de capeletti.
Mas, claro, há características
que jamais nos abandonam, por mais que imaginemos estarmos imersos nas
tradições, usos e costumes de determinada comunidade. Se me virem quieto,
mastigando polenta com queijo e bebericando goles de vinho, tudo bem, me
compram por gringo. Mas, se me escutarem pedir um copo de leiTE quenTE, que faz
bem para a genTE, bom, aí entrego sem pudor as minhas origens alienígenas.
Mas o principal aspecto que
comprova minha capacidade camaleônica de me inserir no meio em que passo a
conviver é o fato de que há anos passei a “falar com as mãos”, como é costume
antigo aqui por essas aragens serranas, em especial entre os descendentes de
italianos. Ainda não falo alto, naquele volume dois tons acima do socialmente
aceitável em outras localidades, mas definitivamente não consigo mais me
comunicar se não puder utilizar as duas mãos e vários centímetros dos braços
até os cotovelos, para auxílio gestual daquilo que estou dizendo.
Aprendi que não existe isso de
usar somente o aparelho vocal e a língua portuguesa para dizer “eu fui até lá”,
por exemplo. É preciso sublinhar a frase utilizando o braço todo, a mão em
forma de punho, o dedo indicador em riste, e acompanhar o dito com um movimento
largo de deslocamento, que explica a distância desse “lá” aonde andei indo. Mas
ainda não tenho a destreza dos nativos, sou ainda um amador. Tanto é que, nos
restaurantes, quando falo e narro uma história, minha mesa costuma estar
permanentemente cercada por garçons que, de longe, imaginam que eu os esteja
chamando com meus inábeis gestos. Preciso praticar mais e aprimorar minha
comunicação, sei disso.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 10 de novembro de 2014)
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